Recebimento: 27/09/2022 |
Fase: Distribuir proposição ao Procurador para elaboração de parecer |
Setor:Procuradoria |
Envio: 06/10/2022 15:24:09 |
Ação: Parecer Emitido
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Tempo gasto: 8 dias, 22 horas, 18 minutos
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Complemento da Ação: PROCESSO Nº.: 1.452/2022
PROJETO INDICATIVO Nº.: 30/2022
REQUERENTE: Vereador Dr.º William Miranda
ASSUNTO: Projeto Indicativo que dispõe sobre a criação, pelo Município, de assessoria jurídica gratuita específica para os membros da Guarda Civil Municipal e familiares em virtude de algum ato durante o desempenho de suas funções.
PARECER Nº.: 541/2022
EMENTA: Assessoria Jurídica. GCM. Atividade de Alto Risco. Hipossuficiência. Iniciativa do Executivo. Inconstitucionalidade Material. Rejeição.
PARECER DA PROCURADORIA GERAL
1 - RELATÓRIO
A eminente Presidência desta Casa Legislativa encaminhou-nos, consoante disposição do artigo 139 c/c artigo 117, inciso XVII, da Resolução Municipal nº.: 278/2020[1], o Processo em epígrafe para análise e emissão do respectivo Parecer Jurídico, com a apreciação de seus aspectos legais e constitucionais, oportunizando assim a continuidade de sua tramitação.
Até o presente momento os Autos são compostos de Minuta de Projeto Indicativo e despachos de encaminhamento para elaboração de Parecer Jurídico prévio.
O Projeto Indicativo de Lei, por sua vez, de autoria do ilustríssimo e emérito Vereador DR.º WILLIAM MIRANDA, tem como objeto a criação, pelo Município, de assessoria jurídica gratuita para os membros da Guarda Civil Municipal (GCM) que forem processados no âmbito civil, criminal ou administrativo tendo em vista o exercício de suas funções.
A justificativa[2] apresentada, pelo douto Vereador, se resume na hipossuficiência dos agentes da GCM e no alto risco de serem processados durante o exercício profissional em razão de sua natureza beligerante.
Nestes termos, relatado o feito na forma dos parágrafos anteriores, passo a opinar.
2 - FUNDAMENTAÇÃO
2.1 – Natureza Jurídica do Parecer
O Parecer é um ato administrativo enunciativo com a finalidade de auxiliar tecnicamente a autoridade solicitante, consoante o disposto no Anexo VI, Item 7.1 da Lei Municipal nº.: 2.656/2003 e demais normais pertinentes.
Quanto ao seu objeto, a análise se restringirá aos aspectos legais, não adentrando em questões discricionárias.
Ademais, a emissão deste Parecer não representa impedimento a eventuais consultas e análises jurídicas de questões não abordadas, em caso de solicitação pelas Comissões, Mesa Diretora ou Presidência.
2.2 – Da Legalidade e da Constitucionalidade
A finalidade precípua deste Parecer é fornecer uma análise técnica e preventiva acerca da legalidade e constitucionalidade do objeto deste Processo.
O controle de constitucionalidade é um desses mecanismos, provavelmente o mais importante, consistindo na verificação da compatibilidade entre uma lei ou qualquer ato normativo infraconstitucional e a Constituição, fundamento de validade do sistema jurídico. Com relação ao tema, o autor Flávio Martins[3] apresenta um conceito elucidativo:
Controle de constitucionalidade consiste na verificação da compatibilidade das leis e dos atos normativos com a Constituição. Decorre da supremacia formal da Constituição sobre as demais leis do ordenamento jurídico de um país. Ora, se a Constituição é a lei mais importante do ordenamento jurídico, sendo o pressuposto de validade de todas as leis, para que uma lei seja válida precisa ser compatível com a Constituição. Caso a lei ou o ato normativo não seja compatível com a Constituição, será inválido, inconstitucional.
Quanto a aferição da constitucionalidade por ação existe duas espécies de controle: material e formal.
O controle material de constitucionalidade é aquele que leva em consideração se conteúdo da matéria da proposição é de competência de determinado ente. Enquanto o controle formal visa aferir se o processo legislativo fora respeitado. É o entendimento da doutrina pátria[4], a seguir:
Há duas espécies de inconstitucionalidade por ação: material e formal.
a) Inconstitucionalidade material
Ocorre a inconstitucionalidade material quando o conteúdo da lei ou ato normativo fere a Constituição. Assim, se o conteúdo de uma lei violar as regras ou princípios constitucionais, poderá ser declarado inconstitucional, pelo vício material.
[...]
Se o conteúdo da lei violar regra ou princípio constitucional, será declarado materialmente inconstitucional.
b) Inconstitucionalidade formal
Ao contrário da inconstitucionalidade material, na qual o problema está no conteúdo da norma, na inconstitucionalidade formal, o problema, o vício, está no processo de criação da norma, na sua forma, portanto.
[...]
b.1) Inconstitucionalidade formal orgânica
Trata-se do vício de inconstitucionalidade decorrente da incompetência para elaboração da lei ou ato normativo. A Constituição Federal enumera a competência dos entes federativos.
[...]
b.2) Inconstitucionalidade formal propriamente dita
A inconstitucionalidade formal propriamente dita ocorre quando há um vício no processo de formação da lei (processo legislativo). O vício pode se dar em qualquer uma das fases desse processo. Primeiramente, pode ocorrer um vício de iniciativa.
b.3) Inconstitucionalidade formal por violação a pressupostos objetivos do ato normativo
[...]
Em algumas situações, a lei, ou ato normativo, é feita pela autoridade correta, legítima, respeita integralmente o seu procedimento de criação, mas não atende a um requisito objetivo externo.
2.2.1 – Da Constitucionalidade Material
Sob o prisma do controle material, será analisado se a matéria do Projeto Indicativo de Lei em comento fere normas e princípios constitucionais.
Preliminarmente impende destacar que o Projeto Indicativo não pretende criar nenhuma instituição, muito menos uma Defensoria Pública Municipal.
Seu escopo se resume a prestação de serviços de assessoria jurídica aos membros da GCM e, respectivamente, famílias, nos termos dos artigos 1º e 4º da Minuta, vejamos:
Art.1º - O Município prestará assistência judiciária aos membros da Guarda Civil Municipal que, por conta do exercício de suas funções, forem processados no âmbito civil, criminal e administrativo.
§1º - A assistência também compreende:
I – processos administrativos movidos por ou perante outros entes federativos ou suas autarquias, bem como perante autarquias ou fundações municipais;
II – demandas administrativas ou judiciais que a família do membro da Guarda Civil Municipal tiver em virtude do processo sofrido elo membro da Guarda Civil Municipal;
III – demandas administrativas ou judiciais que o membro da GCM ou sua família tiver em virtude de falecimento ou invalidez, desde que decorrentes do exercício das funções do cargo.
§ 2º - A assistência inclui, além dos advogados, o pagamento de eventuais custas processuais, inclusive recursais.
§ 3º - O dever de prestar assistência de que trata esta Lei independe da concessão do benefício da Justiça Gratuita.
[...]
Art.4º - Para prestar o serviço de advocacia, o Município poderá:
I – designar tal função à Procuradoria-Geral do Município, por meio de lei de iniciativa do Prefeito ou ato do Prefeito;
II – firmar convênio com instituições que prestam serviço jurídico;
III – contratar escritório de advocacia, observando as regras de licitação e a disponibilidade orçamentária.
Segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal é permitido aos municípios a prestação de serviços de assessoria jurídica para a população hipossuficiente, tendo em vista não se tratar de atividade privativa ou exclusiva de determinado ente federativo ou instituição pública. Para ilustrar seguem as lições do constitucionalista Pedro Lenza[5], a saber:
Existe Defensoria Pública municipal?
Não!
Assim como não há MP e Judiciário municipais, não se admite, nos termos da Constituição, a criação de uma Defensoria Pública municipal. Na verdade, existem núcleos da Defensoria Pública, tanto a Federal como a Estadual, nos Municípios.
O STF, ao analisar o caso específico de leis do município de Diadema (SP) que tratam da prestação do serviço de assistência jurídica e da Defensoria Pública, concluiu que os municípios podem instituir serviço de prestação de assistência jurídica à população necessitada e de baixa renda, já que não se trata de monopólio dos demais entes federativos.
Conforme ficou estabelecido, “a prestação desse serviço público para auxílio da população economicamente vulnerável não visa substituir a atividade prestada pela Defensoria Pública. O serviço municipal atua de forma simultânea. Trata-se de mais um espaço para garantia de acesso à jurisdição (art. 5.º, LXXIV, CF/88)”.
“Os municípios detêm competência para legislar sobre assuntos de interesse local, decorrência do poder de autogoverno e de autoadministração. Assim, cabe à administração municipal estar atenta às necessidades da população, organizando e prestando os serviços públicos de interesse local (CF, art. 30, I, II e V)”.
“Além disso, a competência material para o combate às causas e ao controle das condições dos vulneráveis em razão da pobreza e para a assistência aos desfavorecidos é comum a todos os entes federados (CF, art. 23, X)” (ADPF 279, j. 03.11.2021, Pleno, 8 x 1, pendente a publicação do acórdão, Inf. 1.036/STF).
Com isso, afastou-se o entendimento de que é atividade privativa da defensoria pública a defesa dos mais carentes.
Sendo assim, o Município pode prestar os serviços de assessoria jurídica para os mais necessitados de forma legítima e constitucional. Se por acaso algum servidor, incluído no conceito de hipossuficiência, necessitar desse auxílio não haveria óbice legal para a tutela de seus direitos e interesses.
No entanto, as funções institucionais da procuradoria municipal possuem características e finalidades bem distintas da advocacia privada, sem olvidar que em alguns casos poderia ser obrigada a advogar contra a pessoa jurídica de direito público em relação à qual pertençam, em prol de assessorar determinado comportamento de um agente da GCM.
A Lei Complementar Municipal nº.: 3781/ 2011[6], define as funções e competências institucionais da Procuradoria Municipal, ipsis litteris:
Art. 2º A Procuradoria Geral do Município é uma instituição permanente, essencial ao exercício das funções administrativas e jurisdicional no âmbito do Município, com nível hierárquico equivalente a Secretaria Municipal e subordinada diretamente ao Chefe do Poder Executivo Municipal, sendo responsável, em toda a sua plenitude, pela defesa do Município, em juízo e fora dele, bem como pelas funções de consultoria e assessorial jurídica, ressalvadas as competências autárquicas, sob a égide dos princípios da legalidade e da indisponibilidade dos interesses públicos.
CAPÍTULO II
DA COMPETÊNCIA
Art. 3º Compete a Procuradoria Geral do Município:
I - exercer a representação judicial e extrajudicial do Município de Serra, na forma estabelecida em lei;
II - promover a propositura de ações e defender os interesses do Município perante qualquer Juízo ou Tribunal, bem como junto às instâncias administrativas;
III - coordenar a propositura de medidas de caráter jurídico que visem proteger o patrimônio dos órgãos da Administração Municipal;
IV - coligir elementos de fato e de direito e preparar, em regime de urgência, as informações que devam ser prestadas em Mandados de Segurança, impetrado contra ato de autoridades da Administração Direta do Município;
V - oficiar, no interesse do Município, perante os órgãos do Judiciário e do Ministério Público;
VI - promover o exame de ordens e sentenças judiciais e orientar o Prefeito Municipal e os Secretários Municipais e as demais Autoridades ou Servidores Municipais quanto ao seu exato cumprimento;
VII - exercer a consultoria judicial do Município e assessorar juridicamente as demais unidades administrativas do Município e seus respectivos dirigentes;
VIII - propor ação civil pública, em representação do Município;
IX - examinar e aprovar previamente as minutas dos editais de licitação, contratos, acordos, convênios, ajustes e quaisquer outros instrumentos em que haja um acordo de vontades para formação de vínculo obrigacional, oneroso ou não, qualquer que seja a denominação dada aos mesmos, celebrados por quaisquer órgãos ou entidades integrantes da Administração do Município, inclusive seus aditamentos;
X - zelar pela fiel observância e aplicação das leis, decretos, portarias e regulamentos existentes no Município, principalmente no que se refere ao controle da legalidade dos atos praticados pelos agentes públicos;
XI - atender aos encargos de consultoria e assessoria jurídica do Município, providenciando a emissão de pareceres sobre questões jurídicas em processos que versem sobre o interesse da municipalidade, examinando projetos de leis, vetos, decretos e atos normativos em geral;
XII - propiciar a unificação de pareceres sobre questões jurídicas e de interpretação sobre as quais haja controvérsia;
XIII - fixar administrativamente a interpretação da Constituição, das leis, decretos, ajustes, contratos e atos normativos em geral, a ser uniformemente observada pelos órgãos da Administração Municipal, editando súmulas e enunciados administrativos;
XIV - proceder à cobrança administrativa e judicial da dívida ativa tributária e da proveniente de quaisquer outros créditos do Município, competindo-lhe exclusivamente o apontamento de títulos para protesto;
XV - atuar como 2º instância recursal nos processos fiscais e tributários, por meio do Conselho de Recursos Fiscais;
XVI - processar, amigável ou judicialmente, as desapropriações, fazendo gestões para que seja providenciado o pagamento das indenizações correspondentes;
XVII - requisitar aos órgãos e entidades da Administração Municipal, certidões, cópias, exames, informações, diligencias e esclarecimentos necessários ao cumprimento de suas finalidades institucionais;
XVIII - celebrar convênios com órgãos semelhantes da União, Estados e demais Municípios que tenham por objetivo a troca de informações e o exercício de atividades de interesse comum, bem como o aperfeiçoamento e a especialização dos Procuradores do Município; e
XIX - promover estudos e sugerir revisões na legislação;
XX - exercer outras atividades compatíveis com sua destinação constitucional.
Sendo assim, pelo fato de a assistência jurídica apresentada não estar tutelando o interesse do Município como pessoa jurídica sujeito de direitos, mas o de seu agente, e que com ele não se confunde, não poderá ficar a cargo da Procuradoria Municipal.
Ressalta-se que este Parecer não adentrará no mérito, v.g., se há procuradores suficientes ou outros aspectos adstritos à oportunidade e conveniência.
Quanto à possibilidade de assessoria jurídica aos agentes da GCM oferecidos pelo Município por intermédio de convênio ou contratação de escritório de advocacia, esbarra-se em outra questão: princípios constitucionais.
Uma lei nesse sentido vulnera princípios constitucionais fundamentais como o interesse público, a moralidade, a impessoalidade e a razoabilidade. Cria distinção que não atende ao interesse público primário consubstanciado no interesse da coletividade, além de implicar no uso de recursos do poder público para satisfação de interesses pessoais de agentes públicos.
É o entendimento da jurisprudência pátria, tendo em vista que temas similares já foram enfrentados nos tribunais, onde destaca-se o E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, in verbis:
ADI. Lei n. 4.487, de 16/4/2021, de Itapeva. Criação de serviço de assistência jurídica gratuita para o pessoal da Guarda Civil local. Norma de iniciativa da Edilidade. Violação da reserva legislativa do Prefeito. Ofensa formal. Tema a ser, quando o caso, veiculado por lei complementar. Ofensa à igualdade, base do sistema republicano. Precedente deste colendo Órgão Especial. Ação procedente, desnecessária modulação.
(TJSP; Direta de Inconstitucionalidade 2091634-77.2022.8.26.0000; Relator (a): Costabile e Solimene; Órgão Julgador: Órgão Especial; Tribunal de Justiça de São Paulo - N/A; Data do Julgamento: 21/09/2022; Data de Registro: 22/09/2022)
(Grifos apostos)
"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – Prequestionamento – Inadmissibilidade – Desnecessidade de se mencionar expressamente os dispositivos em que se baseou o julgamento embargado – Omissão da questão à luz da autonomia municipal, dos princípios republicano, democrático e da separação dos poderes e da possibilidade de o Chefe do Executivo expedir decretos autônomos – Inexistência de obscuridade, contradição ou omissão – Efeito infringente – Inadmissibilidade. 'Constitucional – Administrativo – Ação Direta de Inconstitucionalidade – Artigo 21 da Lei 14.125, de 29 de dezembro de 2005 e Decreto 48.084, de 5 de janeiro de 2007 – Inconstitucionalidade – Ocorrência. Desrespeito à iniciativa legislativa reservada ao Chefe do Poder Executivo e desvio de poder de emenda parlamentar por impertinência temática – Inconstitucionalidade formal. Atribuições institucionais da Advocacia Pública – Princípio da simetria – Representação judicial de agentes públicos em face de sua responsabilidade pessoal – Afronta aos princípios da impessoalidade, moralidade, razoabilidade e ao interesse público primário – Inconstitucionalidade material. Decreto regulamentar deve ter interpretação estrita, diante da norma do artigo 84, inciso IV, da Constituição da República, sem a possibilidade de extensão dada ao Presidente da República no inciso VI – Inconstitucionalidade por arrastamento. Ação procedente.' Embargos da Municipalidade não conhecidos e rejeitados os do Prefeito Municipal."
(TJSP; Embargos de Declaração Cível 0252533-35.2012.8.26.0000; Relator (a): Carlos Bueno; Órgão Julgador: Órgão Especial; Tribunal de Justiça de São Paulo - N/A; Data do Julgamento: 03/05/2017; Data de Registro: 05/05/2017)
(Grifos apostos)
Ademais, consigna-se que se algum agente hipossuficiente, nos termos da legislação, for processado gozará de assistência gratuita oferecida pelo Estado e por instituição própria, como a Defensoria Pública. Não a advocacia pública do Município.
Nada impede que o Município crie, conforme demonstrado na ADPF 279, j. 03.11.2021, serviços de assessoria jurídica geral, ampliando e robustecendo ainda mais a defesa dos interesses e direitos daqueles que necessitarem, incluindo os agentes da GCM que se enquadrarem nos parâmetros de hipossuficiência.
Portanto, materialmente, o conteúdo do Projeto Indicativo nº.: 30/2022 deve ser rejeitado, por ser inconstitucional.
2.2.2 – Da Constitucionalidade Formal
Ad argumentandum tantum, será analisada a constitucionalidade formal do Projeto Indicativo nº.: 30/2022.
Quanto a constitucionalidade formal orgânica, a Constituição Federal prevê ser de competência legislativa dos municípios o poder de complementar (poder suplementar) a legislação federal e estadual para ajustar a sua execução às particularidades locais. Nesse mister legislativo, a lei municipal não poderá contrariá-las e deverá estar adstrita ao interesse local, requisito da repartição de competências dos municípios.
Esse raciocínio decorre da própria Legislação Pátria, mais precisamente da Constituição Federal (art.30, I e II), da Constituição Estadual (art.28, I e II) e da Lei Orgânica Municipal (Lei nº.: 0/1990, art. 30, I e II), a saber:
Constituição Federal:
Art. 30. Compete aos Municípios:
I - legislar sobre assuntos de interesse local;
II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;
Constituição Estadual:
Art. 28. Compete ao Município:
I - legislar sobre assunto de interesse local;
II - suplementar a legislação federal e estadual no que couber;
Lei Orgânica Municipal:
Art. 30. Compete ao Município da:
I - legislar sobre assuntos de interesse local;
II - Suplementar a legislação federal e estadual, no que couber;
Dessa forma, não sendo a matéria de competência exclusiva ou privativa da União e/ou Estados, exceto nos casos em que cabe à União somente editar normas gerais (CRFB, art. 22, XXI e XXVII), poderá o Município realizar a suplementação legislativa, desde que haja interesse local e não seja conflitante com lei federal ou estadual.
Trata-se de um poder derivado do artigo 18 da Constituição Federal[7], no qual os Entes Federativos possuem autonomia para a sua organização político-administrativa, conforme lições[8] a seguir:
A autonomia é o poder atribuído aos entes federativos, constitucionalmente assegurado. Implica o poder de auto-organização, dentro dos limites constitucionais, de cada ente federativo, ou seja, um poder governamental próprio, político e administrativo. Para que a autonomia se concretize, é necessário que o ente federativo possua competências e rendas próprias.
O Projeto Indicativo de Lei nº.: 30/2022, consoante discrimina o artigo 1º da Minuta de Projeto de Lei, demonstra ser matéria passível de suplementação, eis que afeta ao interesse local e por tratar de assistência jurídica (CRFB, art.24, XIII)[9], atraindo assim a competência constitucional material suplementar do Município.
No que tange o controle formal de constitucionalidade propriamente dito, aquele que visa aferir se o processo legislativo fora respeitado, será analisada a iniciativa para deflagração do processo legislativo referente a matéria apresentada em virtude do estágio que se encontra o trâmite do Processo nº.: 1.452/2022.
Por se tratar de uma norma referente a assistência jurídica e uma obrigação destinada a Prefeitura, com repercussão a sua organização administrativa, a competência para iniciativa da lei é do Poder Executivo, uma vez que se imiscui nas competências privativas dispostas no inciso II do parágrafo único do artigo 143 da Lei Municipal nº.: 0/1990, vejamos:
Art. 143 - A iniciativa das leis compete a qualquer Vereador ou Comissão da Câmara Municipal, ao Prefeito Municipal, e aos cidadãos na forma e nos casos previstos nesta Lei Orgânica.
Parágrafo Único. São de iniciativa privativa do Prefeito as leis que disponham sobre:
[...]
II - organização administrativa e pessoal da administração do Poder Executivo;
(Grifos apostos)
Dessa forma, a proposição, ora analisada, sob o prisma formal não é inconstitucional ou ilegal por ser uma recomendação da Câmara Legislativa para que o Poder Executivo deflagre o início do processo legislativo sobre matéria de sua competência, conforme regulamentou a Resolução Municipal nº.: 278/2020 no artigo 136, a saber:
Art. 136 O Projeto Indicativo é a recomendação da Câmara Municipal da Serra ao Poder Executivo local, no sentido de que este promova a abertura de processo legislativo que verse sobre matéria de sua competência.
Parágrafo único. Os Projetos Indicativos terão a forma de Minuta de Projeto de Lei.
(Grifos apostos)
Sendo assim, conclui-se que sob o aspecto formal inexiste inconstitucionalidade.
2.3 – Da Técnica Legislativa
Em relação a técnica legislativa aplicada à Minuta, verifica-se que preencheu as principais diretrizes da Lei Complementar nº.: 95/98 e da Resolução Municipal nº.: 278/2020.
3 - CONCLUSÃO
Ante o exposto, nos termos da fundamentação supra, que integra o presente parecer, OPINAMOS pelo NÃO PROSSEGUIMENTO do Projeto Indicativo de Lei nº.: 30/2022, eis que se encontra em desconformidade material com a Magna Carta.
Salienta-se que o presente Parecer não avaliou a oportunidade e conveniência da matéria, eis que é exclusiva do Vereador proponente, não cabendo a esta Procuradoria emitir juízo de valor sobre ela.
À consideração superior.
Serra/ES, 28 de setembro de 2022.
LUIZ GUSTAVO GALLON BIANCHI
Procurador
Matr. 4075277
LEANDRO PALHONI MAGEVISKI
Assessor Jurídico
Nº Funcional 4125029-00
[1] Art. 117 São modalidades de proposição:
[...]
XVII – os projetos indicativos;
Art. 139 As proposições constantes nos incisos I, II, III, IV, V, IX, XI, XII, XIV e XVI do art. 117, serão protocolizadas e submetidas pela Presidência à Procuradoria, no prazo de 05 dias úteis, para análise jurídica preliminar.
Parágrafo único. Nos casos de proposições submetidas ao regime de urgência especial, a Procuradoria será instada a se manifestar de imediato.
[2] Art. 122, II da Resolução nº.: 278/2020
[3] MARTINS, Flávio. Curso de Direito Constitucional. 3ª ed. São Paulo, SP: SaraivaJur. 2019.
[4] Idem.
[5] LENZA, Pedro. Direito Constitucional. 26ª ed. São Paulo, SP: SaraivaJur, 2022.
[6] Legislação orgânica da Procuradoria Geral do Municipio - PROGER
[7] Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.
[8] Constituição Federal Interpretada. Organizadores Costa Machado e Anna Candida da Cunha Ferraz. 9ª Ed. Barueri, SP: Malone, 2018. Página 120.
[9] Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
[...]
XIII - assistência jurídica e Defensoria pública;
(Grifos apostos)
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Documento(s) da tramitação:
Despacho Digital
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