| Recebimento:  28/10/2025  |             
                                                                    Fase: Distribuir proposição ao Procurador para elaboração de parecer | 
                                                                    Setor:Procuradoria | 
                                                                 
                                                                
                                                                    | Envio: 03/11/2025 16:34:13 | 
                                                                    Ação: Parecer Emitido
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                                                                    Tempo gasto: 6 dias, 1 hora, 55 minutos
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                                                                    Complemento da Ação: Processo nº: 6/2025
Projeto Indicativo nº: 194/2025
Requerente: Vereador Cabo Rodrigues
Assunto: “Transformação da 4ª Companhia do 6º Batalhão em um batalhão independente, visando melhorias na segurança pública do município da Serra”.
Parecer nº: 729/2025
 
PARECER DA PROCURADORIA GERAL
1. RELATÓRIO
Cuidam os autos de Projeto Indicativo nº 729/2025, de autoria do Vereador Cabo Rodrigues, que “Transformação da 4ª Companhia do 6º Batalhão em um batalhão independente, visando melhorias na segurança pública do município da Serra”.
Em seus fundamentos o Ilustre Vereador defende que “A Serra, com uma população crescente e uma área territorial vasta, enfrenta desafios contínuos em relação à segurança pública. A atual estrutura de policiamento, com a 4ª Companhia pertencente ao 6º Batalhão, tem se mostrado insuficiente para atender à demanda da população e ao aumento das ocorrências. A descentralização da Companhia, transformando-a em um batalhão independente, trará benefícios significativos para a segurança da cidade e permitirá uma maior autonomia na gestão de ações preventivas e ostensivas. A 4ª Companhia, localizada estrategicamente no município da Serra, tem um histórico de excelência no combate à criminalidade, mas sua integração ao 6º Batalhão, com sede em outra localidade, limita sua capacidade de resposta rápida e eficiente. Com a independência, seria possível aumentar a presença policial nas áreas mais críticas e potencializar o atendimento às demandas da população, além de otimizar os recursos e a logística operacional.”.
Diante disso, a Presidência desta Casa de Leis encaminhou-nos o processo para a necessária averiguação da constitucionalidade do Projeto de Lei, com consequente emissão de Parecer.
Compõem os autos até o momento o projeto de Lei e justificativa, motivo pelo qual a Presidência desta Casa de Lei nos encaminhou os autos para a sua análise jurídica preliminar. Nestes termos, relatado o feito na forma dos parágrafos anteriores, considerando a importância e urgência da proposta sob avaliação, passo a opinar de forma direta e objetiva.
2. FUNDAMENTAÇÃO
Nestes termos, relatado o feito na forma dos parágrafos anteriores, passo a opinar.
Ab initio, é preciso ressaltar que o presente parecer é meramente opinativo e decorre do mandamento consubstanciado no art. 18, IV, da Lei Municipal nº 6.134/2025, o qual determina à Procuradoria elaborar pareceres escritos nos processos que lhe forem encaminhados pelo Presidente desta Augusta Casa de Leis, a fim de assegurar a correta e justa aplicação do ordenamento jurídico pátrio, bem como resguardar as competências atribuídas pela Lei Orgânica do Município e as normas estabelecidas na Resolução nº 278/2020.
Nesse diapasão, convém destacar que a emissão do presente parecer não representa óbice a eventual análise jurídica acerca de outras questões não abordadas no mesmo ou no tocante ao mérito da matéria submetida ao apreço, em caso de solicitação pelas Comissões, Mesa Diretora ou Presidência.
Nessa vereda, ressalta-se que no presente parecer jurídico preliminar, de um modo geral, aprecia-se a legalidade e constitucionalidade do projeto de lei sobre três perspectivas elementares: a um, a matéria legislativa proposta deve se encontrar entre aquelas autorizadas pela CF/88 aos Municípios; a dois, se foi respeitada a rígida observância das preferências quanto à iniciativa para proposição prevista pela ordem jurídico-constitucional; a três, a possibilidade de violação por parte da matéria legislativa proposta à direitos fundamentais ou instituições tuteladas por regras ou princípios constitucionais.
Em via reflexa, cumpre destacar que a aprovação de um projeto de lei também passa pela comprovação dos requisitos constitucionais e legais para a sua regular tramitação.
Do ponto de vista material, e atentando para a regra constitucional que prescreve a competência legislativa local dos municípios, percebe-se claramente que, não estando a matéria aqui tratada no rol daquelas de competência legislativa privativa da União ou dos Estados, não há óbice para que o assunto seja regulado por Lei Municipal.
Este entendimento decorre do art. 30, I e II, da Constituição Federal, do art. 28, I e II, da Constituição Estadual e do art. 30, I e II, e 99, XXVIII, da Lei Orgânica Municipal, todos dispositivos que asseguram a competência da Câmara Municipal para legislar acerca de assuntos de interesse local, suplementando a legislação federal e estadual.
Constituição Federal
Art. 30. Compete aos Municípios:
I - legislar sobre assuntos de interesse local;
II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;
 
Constituição Estadual
Art. 28. Compete ao Município:
I - legislar sobre assunto de interesse local;
II - suplementar a legislação federal e estadual no que couber;
 
Art. 30 - Compete ao Município da:
I - legislar sobre assuntos de interesse local;
II - Suplementar a legislação federal e estadual, no que couber;
 
A análise de um projeto de lei exige a verificação de sua compatibilidade com as normas hierarquicamente superiores, notadamente a Constituição Federal, a Constituição Estadual e a própria Lei Orgânica do Município.
Nessa vereda, a Constituição Federal de 1988 estabelece uma clara divisão de competências entre os entes federativos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios). No que se refere à segurança pública, o art. 144 da Carta Magna define os órgãos responsáveis e sua estrutura, atribuindo aos Estados a organização e manutenção de suas polícias (Civil e Militar) e corpos de bombeiros militares.
A Polícia Militar é, portanto, um órgão da administração pública estadual, subordinada diretamente ao Governador do Estado, a quem compete, privativamente, a iniciativa de leis que versem sobre sua organização, efetivo, funcionamento e regime jurídico, conforme o princípio da simetria com o art. 61, § 1º, II, 'e', da Constituição Federal.
Ao Município, a Constituição atribui, no art. 30, a competência para legislar sobre assuntos de interesse local e, no art. 144, § 8º, a faculdade de constituir guardas municipais, destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações.
Qualquer tentativa do legislador municipal de criar atribuições, ditar procedimentos ou interferir no funcionamento da Polícia Militar extrapola a competência municipal e invade a esfera de competência do Estado, configurando manifesta inconstitucionalidade, ainda que por meio de Projeto Indicativo.
Destarte, o Projeto de Lei, ao pretender dispor sobre a atuação de um órgão estadual, padece de vício de iniciativa formal, pois a matéria é de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo Estadual (Governador). A sanção do Prefeito, caso ocorra, não tem o poder de convalidar tal vício, conforme entendimento pacificado do Supremo Tribunal Federal.
STF - ADI: 6337 DF, Relator: ROSA WEBER, Data de Julgamento: 24/08/2020, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 22/10/2020 - EMENTA - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONSTITUCIONAL. PROCESSO LEGISLATIVO NO ÂMBITO ESTADUAL. ART. 70, § 2º, CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE MINAS GERAIS. VÍCIO DE INICIATIVA DE PROJETO DE LEI. SANÇÃO DO PODER EXECUTIVO. AUSÊNCIA DE CONVALIDAÇÃO PROCESSUAL DO VÍCIO DE INICIATIVA. PRECEDENTES. PROCEDÊNCIA. INCIDÊNCIA DA REGRA DO ART. 27 DA LEI 9.868/99. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO. SITUAÇAO DE TUTELA DA SEGURANÇA JURÍDICA E EXCEPCIONAL INTERESSE SOCIAL. Sanção executiva não tem força normativa para sanar vício de inconstitucionalidade formal, mesmo que se trate de vício de usurpação de iniciativa de prerrogativa institucional do Chefe do Poder Executivo. O processo legislativo encerra a conjugação de atos complexos derivados da vontade coletiva de ambas as Casas do Congresso nacional acrescida do Poder Executivo. Precedentes. Os limites da auto-organização a política não podem violar a arquitetura constitucional estruturante. O processo legislativo encerra complexo normativo de edificação de espécies normativas de reprodução obrigatória. Nesse sentido, a interpretação jurídica adscrita ao art. 25 da Constituição Federal (ADI 4.298, ADI 1.521, ADI 1.594. ADI 291).
Norma Originária de conformação do processo legislativo estadual com vigência há mais de três décadas. A modulação dos feitos da decisão, no caso, apresenta-se como necessária para a tutela adequada da confiança legítima que resultou na prática de atos com respaldo em autoridade aparente das leis publicadas e observa a boa-fé é objetiva enquanto princípio geral de direito norteador das decisões judiciais. Ação direta de inconstitucionalidade procedente, com atribuição de modulação dos efeitos da decisão.
A sanção executiva não tem força normativa para sanar vício de inconstitucionalidade formal, mesmo que se trate de vício de usurpação de iniciativa de prerrogativa institucional do Chefe do Poder Executivo.
Além do vício formal, há uma inconstitucionalidade material por usurpação da competência legislativa do Estado, violando o pacto federativo. A jurisprudência é uníssona em rechaçar leis municipais que interferem em órgãos de segurança estaduais.
TJ-ES - ADI: 00055305920188080000, Relator: ARTHUR JOSÉ NEIVA DE ALMEIDA, Data de Julgamento: 06/09/2018, TRIBUNAL PLENO, Data de Publicação: 13/09/2018 –EMENTA - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE INCISOS, II, III E V DO ART. 4º, DA LEI MUNICIPAL DE GOVERNADOR LINDEMBERG N.º 684/2014 CONSELHO MUNICIPAL DE SEGURANÇA CRIAÇÃO DE ATRIBUIÇÃO PARA O MINISTÉRIO PÚBLICO E PARA A POLÍCIA MILITAR E POLÍCIA CIVIL - NORMA QUE EXCEDE A COMPETÊNCIA LEGISLATIVA MUNICIPAL OFENSA À SEPARAÇÃO DOS PODERES - PEDIDO PROCEDENTE. Não compete ao legislador municipal a iniciativa de lei que crie atribuição para o Ministério Público, ao qual é garantida a independência funcional e autonomia administrativa. Também não lhe compete criar atribuições para as Polícias Civil e Militar, já que a Constituição Estadual prevê a iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo Estadual para elaboração de leis que disponham sobre as atribuições de seus órgãos. Os preceitos em análise vão de encontro ao Princípio da Separação dos Poderes, provocando indevida ingerência do Município na esfera de competência do Estado. Ação julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade dos incisos, II, III e V do art. 4º, da Lei Municipal de Governador Lindemberg n.º 684/2014.
 
Não compete ao legislador municipal criar atribuições para as Polícias Civil e Militar, já que a Constituição Estadual prevê a iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo Estadual para elaboração de leis que disponham sobre as atribuições de seus órgãos, configurando indevida ingerência do Município na esfera de competência do Estado.
 
TJ-SC - Direta de Inconstitucionalidade: 8000075-98.2016.8.24.0000, Relator: Jaime Ramos, Data de Julgamento: 15/02/2017, Órgão Especial - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI N. 4.666/2010, DO MUNICÍPIO DE CANOINHAS, DE INICIATIVA PARLAMENTAR, QUE PROÍBE O CONSUMO DE BEBIDAS ALCOÓLICAS DE QUALQUER GRADUAÇÃO EM CERTOS LOGRADOUROS PÚBLICOS MUNICIPAIS (ARTS. 1º E 2º) E IMPÕE AO PREFEITO A OBRIGAÇÃO DE FIRMAR CONVÊNIO COM A POLÍCIA MILITAR PARA FISCALIZAR O CUMPRIMENTO DA LEI (ART. 3º) - INDEVIDA INTERFERÊNCIA EM ATOS DE GESTÃO E ADMINISTRAÇÃO DO CHEFE DO EXECUTIVO MUNICIPAL - OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO E INDEPENDÊNCIA DOS PODERES (ART. 32, DA CE/1989) - ATRIBUIÇÃO DE OBRIGAÇÕES À POLÍCIA MILITAR QUE É SUBORDINADA AO GOVERNADOR DO ESTADO (ART. 4º) - OFENSA AO PRINCÍPIO FEDERATIVO (ART. 1º E 107, DA CE/1989) - PROIBIÇÃO DO CONSUMO DE BEBIBAS ALCOÓLICAS EM LOGRADOUROS PÚBLICOS QUE, A PRETEXTO DE GARANTIR MAIOR SEGURANÇA, RESTRINGE O DIREITO DE LIBERDADE INDIVIDUAL - OFENSA AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE - PROCEDÊNCIA DO PEDIDO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI N. 4.666/2010, DO MUNICÍPIO DE CANOINHAS - EFEITOS EX TUNC E ERGA OMNES. A lei, de iniciativa parlamentar, que impõe ao Poder Executivo a prática de atos de gestão - firmar convênio com a Polícia Militar do Estado de Santa Catarina "para a fiscalização do cumprimento" da Lei n. 4.666/2010, do Município de Canoinhas (art. 3º) -, é inconstitucionais porque viola o princípio constitucional da separação e independência dos poderes (art. 32, caput, da CE/1989). O Município, nos termos do art. 112, inciso I, da Constituição Estadual, tem competência para "legislar sobre assuntos de interesse local", mas não tem para interferir na organização do serviço público estadual, nem impor obrigações à Polícia Militar do Estado de Santa Catarina, daí por que a Lei n. 4.666/2010, do Município de Canoinhas, ao dizer que "a autoridade policial que flagrar o descumprimento da Lei, determinará ao infrator que cesse a conduta, lavrando termo, tomando as medidas penais cabíveis em caso de descumprimento" (art. 4º), invadiu a competência privativa do Estado de Santa Catarina para organizar e definir as atribuições da Polícia Militar, violando, assim, o art. 1º (princípio federativo) e o art. 107, da Constituição do Estado de Santa Catarina. "A atividade legislativa está necessariamente sujeita à rígida observância de diretriz fundamental, que, encontrando suporte teórico no princípio da proporcionalidade, veda os excessos normativos e as prescrições irrazoáveis do Poder Público. O princípio da proporcionalidade, nesse contexto, acha-se vocacionado a inibir e a neutralizar os abusos do Poder Público no exercício de suas funções, qualificando-se como parâmetro de aferição da própria constitucionalidade material dos atos estatais" (STF - ADI n. 2551 MC-QO/MG, Rel. Ministro Celso de Mello). Por isso, não é proporcional nem razoável a lei que, a pretexto de garantir maior segurança, proíbe o consumo de bebidas alcoólicas em logradouros públicos, mas restringe o direito de liberdade individual, sobretudo porque a ingestão moderada de bebida alcoólica, além de ser legalmente lícita, é socialmente aceita e tolerada e, além disso, o consumo excessivo é reprimido por dispositivos legais mais eficazes.
 
O Município não tem competência para interferir na organização do serviço público estadual, nem impor obrigações à Polícia Militar do Estado, invadindo a competência privativa do Estado para organizar e definir as atribuições da Polícia Militar.
Com relação às questões de técnica legislativa, observo que o projeto de lei atendeu às principais diretrizes da Lei Complementar 95/98, o que não impede eventuais aperfeiçoamentos pelas Comissão deste Parlamento, dentro da margem da conveniência e oportunidade.
Ressalto ainda que em consulta ao sítio eletrônico desta Casa, esta proposta legislativa não se encontra rejeitada nesta Sessão Legislativa, não incidindo, a princípio, o óbice previsto no artigo 67 da CF, e tampouco já foi proposta por outro parlamentar, conforme o § 1º, do Art. 141 do Regimento Interno.
Diante disso, ainda que reconhecendo os elevados valores que imbuíram a proposição da norma, não há como endossar o Projeto Indicativo, por usurpar Competência do Executivo Estadual.
 
3. CONCLUSÃO
Posto isso, firmada em todas as razões e fundamentos já expostos, opina esta Procuradoria pelo não prosseguimento do Projeto de Lei nº 194/2025, por latente Inconstitucionalidade Formal e Material, por vício de iniciativa e de competência legislativa do Estado e violação do Princípio da Separação dos Poderes, sem embargos de eventual análise jurídica sobre o mérito da presente matéria, em caso de solicitação pelas Comissões Competentes, Mesa Diretora e Presidência ou outras questões não abordadas neste parecer.
Ressaltamos que o presente Parecer é de natureza opinativa e não vinculatório específico para este processo, de modo que, todos aqueles participantes do processo, em especial o gestor público, dentro da margem de discricionariedade, juízo de valor e ação que lhes são conferidos, deverão diligenciar pela observância dos princípios e normas constitucionais e infraconstitucionais no caso em destaque.
Destarte, ressaltamos que, incumbe a esta Procuradoria Geral prestar consultoria sob o prisma estritamente jurídico, não lhe competindo adentrar nas razões e pertinência temática do projeto, motivo pelo qual o presente posicionamento não contém natureza vinculativa e sim opinativa, não vinculando o posicionamento desta Procuradoria para outras situações concretas, ainda que parecidos a este projeto.
Esses são os esclarecimentos que formam nosso parecer.
Serra/ES, 29 de outubro de 2025.
 
FERNANDO CARLOS DILEN DA SILVA
Procurador
Nº Funcional 4073096
 
 
 
MAYCON VICENTE DA SILVA
Assessor Jurídico
Nº Funcional 4113594-2
 
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