| Recebimento: 20/08/2025 |
Fase: Distribuir proposição ao Procurador para elaboração de parecer |
Setor:Procuradoria |
| Envio: 17/11/2025 11:02:46 |
Ação: Parecer Emitido
|
Tempo gasto: 88 dias, 20 horas, 22 minutos
|
Complemento da Ação:
PROCESSO Nº: 5046/2025
PROJETO DE LEI nº: 872/2025
REQUERENTE: Vereador Henrique Lima
ASSUNTO: “Institui o Dia Municipal da Neurodiversidade a ser celebrado, anualmente, no dia 27 de março, no âmbito do Município de Serra, Estado do Espírito Santo, e dá outras providências”.
PARECER Nº: 782/2025
PARECER DA PROCURADORIA GERAL
1. RELATÓRIO.
Cuidam os autos de Projeto de Lei 872/2025, de autoria do ilustre Vereador Henrique Lima, que “Institui o Dia Municipal da Neurodiversidade a ser celebrado, anualmente, no dia 27 de março, no âmbito do Município de Serra, Estado do Espírito Santo, e dá outras providências”.
Diante disso, a Presidência desta Casa de Leis encaminhou-nos o processo para a necessária averiguação quantos aos aspectos legais e constitucionais para o início da sua tramitação, com consequente emissão de Parecer.
Compõem os autos até o momento a minuta de Projeto Indicativo, a sua justificativa e os despachos de encaminhamento para elaboração de parecer jurídico prévio.
Por fim, relatado o feito, passo a opinar.
2. FUNDAMENTAÇÃO.
Inicialmente, é preciso ressaltar que o presente parecer é meramente opinativo e decorre do mandamento consubstanciado no art. 18, IV, da Lei Municipal nº 6.134/2025, o qual determina à Procuradoria o assessoramento da Mesa Diretora e da Presidência desta Augusta Casa de Leis, a fim de assegurar a correta e justa aplicação do ordenamento jurídico pátrio, bem como resguardar as competências atribuídas pela Lei Orgânica do Município e as normas estabelecidas na Resolução nº 278/2020.
Nesse diapasão, convém destacar que a emissão do presente parecer não representa óbice a eventual análise jurídica acerca de outras questões não abordadas no mesmo ou no tocante ao mérito da matéria submetida ao apreço, em caso de solicitação pelas Comissões, Mesa Diretora ou Presidência.
Nessa vereda, ressalta-se que no presente parecer jurídico preliminar, de um modo geral, aprecia-se a legalidade e constitucionalidade do projeto de lei sobre três perspectivas elementares: i) a matéria legislativa proposta deve se encontrar entre aquelas autorizadas pela CF/88 aos Municípios; ii) se foi respeitada a rígida observância das preferências quanto à iniciativa para proposição prevista pela ordem jurídico-constitucional; iii) a possibilidade de violação por parte da matéria legislativa proposta à direitos fundamentais ou instituições tuteladas por regras ou princípios constitucionais.
Inicialmente, cumpre destacar que a elevação de um Projeto ao patamar de Lei Municipal passa sempre pela comprovação dos requisitos constitucionais e legais para a sua regular tramitação.
Do ponto de vista material, e atentando para a regra constitucional que prescreve a competência legislativa local dos municípios, se percebe claramente que, não estando a matéria aqui tratada no rol daquelas de competência legislativa privativa da União ou dos Estados, não há óbice para que o assunto seja regulado por Lei Municipal.
Este entendimento decorre do art. 30, I e II, da Constituição Federal, do art. 28, I e II, da Constituição Estadual e do art. 30, I e II, e 99, XIV, da Lei Orgânica Municipal, todos dispositivos que asseguram a competência da Câmara Municipal para legislar acerca de assuntos de interesse local, suplementando a legislação federal e estadual.
Desta maneira, não se vislumbra nenhum óbice à tramitação do projeto, uma vez que o projeto trata de assunto de interesse local.
A proposição legislativa é louvável e alinhada ao interesse público, buscando dar visibilidade e promover a inclusão de pessoas neurodivergentes. A matéria se insere na competência do Município para legislar sobre assuntos de interesse local (art. 30, I, CF/88). No entanto, a forma como o projeto foi redigido apresenta vícios que precisam ser sanados.
O ponto nevrálgico da inconstitucionalidade do projeto reside em seu artigo 3º, que estabelece que o Poder Executivo "promoverá a devida divulgação da data, bem como a realização de palestras, seminários e debates" sobre o tema.
A Lei Orgânica do Município da Serra, em seu artigo 143, parágrafo único, define como competência privativa do Chefe do Poder Executivo a iniciativa de leis que disponham sobre a organização e atribuições dos órgãos da Administração Pública.
Ao determinar que o Poder Executivo realize ações específicas (divulgação, palestras, seminários), o projeto de lei, de iniciativa parlamentar, interfere diretamente na gestão administrativa, criando novas obrigações e, consequentemente, despesas para a municipalidade. Essa imposição caracteriza vício de iniciativa e viola o princípio constitucional da separação dos poderes.
A jurisprudência é consolidada no sentido de que o Poder Legislativo não pode, por meio de lei, ditar as ações a serem executadas pelos órgãos da administração.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. POLÍTICA MUNICIPAL DE ATENDIMENTO INTEGRADO À PESSOA COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA – TEA. INICIATIVA LEGISLATIVA. VÍCIO FORMAL. PROCESSO LEGISLATIVO. INICIATIVA RESERVADA. CHEFE DO EXECUTIVO. É inconstitucional a Lei nº 5.403/23 do Município de Canguçu de iniciativa da Câmara Municipal que instituiu a Política Municipal de Atendimento Integrado à Pessoa com Transtorno do Espectro Autista - TEA, porquanto atribui novas tarefas às Secretarias Municipais de Saúde, Assistência Social e Direitos Humanos e de Educação, Esportes e Cultura, determina a realização de despesas pelo Poder Executivo com a criação de diversos programas e disciplina matérias relativas à gestão administrativa dos serviços públicos, ao regime jurídico dos servidores e ao provimento de cargos públicos. Isso porque se trata de lei relativa à organização, às atribuições e ao funcionamento da Administração Pública Municipal, cujo processo legislativo se submete à exclusiva iniciativa do Chefe do Executivo. Arts. 8º, 60, II, alíneas b e d, e 82, incisos III e VII, da Constituição Estadual. Ação julgada procedente. (TJ-RS - Direta de Inconstitucionalidade: 70085785764, Relator: Maria Isabel de Azevedo Souza, Data de Julgamento: 17/11/2023, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 12/12/2023)
É inconstitucional a Lei de iniciativa da Câmara Municipal que atribui novas tarefas às Secretarias Municipais e determina a realização de despesas pelo Poder Executivo, por se tratar de matéria relativa à organização, às atribuições e ao funcionamento da Administração Pública Municipal, cujo processo legislativo se submete à exclusiva iniciativa do Chefe do Executivo.
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 64, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 13.417/2010 DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. DISPOSITIVO INCLUÍDO POR EMENDA PARLAMENTAR EM PROJETO DE LEI DE INICIATIVA PRIVATIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. SERVIDORES PÚBLICOS ESTADUAIS. REMUNERAÇÃO. AUMENTO DA DESPESA PREVISTA. VEDAÇÃO. ARTS. 61, § 1º, II, a, 63, I, DA CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. VÍCIO DE INICIATIVA. PRECEDENTES. Os arts. 61, § 1º, II, a, e 63, I, da Constituição da Republica traduzem normas de obrigatória observância pelos Estados-membros (arts. 18 e 25 da Constituição da Republica). Segundo a jurisprudência reiterada desta Suprema Corte, embora o poder de apresentar emendas alcance matérias de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, são inconstitucionais as alterações assim efetuadas quando resultem em aumento de despesa, ante a expressa vedação contida no art. 63, I, da Constituição da Republica. Precedentes. Inconstitucionalidade formal do art. 64, parágrafo único, da Lei nº 13.417/2010 do Estado do Rio Grande do Sul, por vício de iniciativa. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente. (STF - ADI: 4884 RS, Relator: ROSA WEBER, Data de Julgamento: 18/05/2017, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 31/05/2017)
São inconstitucionais as alterações efetuadas por emenda parlamentar quando resultem em aumento de despesa, ante a expressa vedação contida no art. 63, I, da Constituição da República. O mesmo raciocínio se aplica a projetos de lei de iniciativa parlamentar que criam despesa para o Executivo.
Portanto, o artigo 3º do Projeto de Lei nº 872/2024 é formalmente inconstitucional e deve ser suprimido para que a proposta possa prosperar.
Doutro giro, o projeto de lei em análise também falha em observar o comando do artigo 2º da Lei Municipal nº 4.950/2019, que determina que toda nova lei que institua data comemorativa deve, obrigatoriamente, mencionar sua inclusão no Calendário Oficial consolidado.
Art. 2º Todas as Leis que instituírem Eventos e Datas Comemorativas no Município da Serra deverão obrigatoriamente mencionar a inclusão nesta Lei.
Este é um vício formal que pode e deve ser corrigido por meio de uma emenda aditiva, garantindo a correta técnica legislativa e a devida atualização do calendário de eventos do município.
Destarte, os vícios identificados, embora relevantes, são passíveis de correção no curso do processo legislativo. A jurisprudência permite o saneamento de projetos de lei, desde que as emendas não desnaturem a proposta original e corrijam as inconstitucionalidades.
A supressão do artigo 3º elimina o vício de iniciativa, restando a essência do projeto, que é a criação da data comemorativa. A adição do artigo que o adequa à Lei nº 4.950/2019, por sua vez, aperfeiçoa-o. Assim, não há impedimento para o prosseguimento da matéria, desde que emendada.
Com relação às questões de técnica legislativa, observo que o projeto de lei atendeu às principais diretrizes da Lei Complementar nº 95/1998.
Nesse contexto, cumpre esclarecer que, conforme estabelece o art. 141 e seus parágrafos do Regimento Interno desta Câmara Legislativa, nos termos da Resolução nº 278/2020, as proposições devem ser protocolizadas eletronicamente ou, excepcionalmente, no Protocolo Geral da Casa, sendo numeradas em ordem sequencial e encaminhadas à Presidência, prevalecendo, em caso de matérias idênticas, a de protocolo mais antigo, com arquivamento das demais. No entanto, após consulta ao sistema legislativo e ao sítio eletrônico desta Casa, verifica-se que não há, nesta Sessão Legislativa, qualquer outra proposição com o mesmo objeto, não incidindo, portanto, o óbice de duplicidade previsto no referido artigo, tampouco a vedação do art. 67 da Constituição Federal, que trata da reapresentação de projetos rejeitados na mesma sessão legislativa.
Ante a todo o exposto, entendo que o presente Projeto de Resolução reúne os requisitos mínimos legais para a sua tramitação.
3. CONCLUSÃO.
Diante do exposto, nos termos da fundamentação supra, que integra o presente parecer, opinamos pelo regular PROSSEGUIMENTO do Projeto de Lei nº 872/2025, desde que suprimido o Art. 3º do indigitado projeto de lei, bem como seja atendida a exigência do Art. 2º da Lei nº 4.950/2019 uma vez que não cumpriu requisito legal para a sua propositura, sem embargos de eventual análise jurídica sobre o mérito da presente matéria, em caso de solicitação pelas Comissões Competentes, Mesa Diretora e Presidência ou outras questões não abordadas neste parecer.
Destarte, ressaltamos que, incumbe a esta Procuradoria Geral prestar consultoria sob o prisma estritamente jurídico, não lhe competindo adentrar nas razões e pertinência temática do projeto, motivo pelo qual o presente posicionamento não contém natureza vinculativa e sim opinativa, não vinculando o posicionamento desta Procuradoria para outras situações concretas, ainda que semelhantes ao presente projeto.
Esses são os esclarecimentos que formam nosso parecer.
Serra/ES, 17 de novembro 2025.
FERNANDO CARLOS DILEN DA SILVA
Procurador
Nº Funcional 4073096
MAYCON VICENTE DA SILVA
Assessor Jurídico
Nº Funcional 4113594-2
|
Documento(s) da tramitação:
Despacho Digital
|
|
|
|