Complemento da Ação: PROCESSO Nº.: 2.537/2022
PROJETO INDICATIVO Nº.: 43/2022
REQUERENTE: Vereador Dr.º William Miranda
ASSUNTO: Projeto Indicativo que dispõe sobre a autorização da inclusão do nome do vereador autor do projeto nos textos das leis sancionadas e promulgadas, e nos decretos legislativos.
PARECER Nº.: 589/2022
EMENTA: República. Impessoalidade. Inconstitucionalidade Material. LC nº.: 95/98 Não Prosseguimento.
PARECER PRÉVIO DA PROCURADORIA GERAL
1 - RELATÓRIO
A eminente Presidência desta Casa Legislativa encaminhou-nos, consoante disposição do artigo 139 c/c artigo 117, inciso XVII, da Resolução Municipal nº.: 278/2020[1], o Processo em epígrafe para análise e emissão do respectivo Parecer Jurídico, com a apreciação de sua juridicidade, legalidade, constitucionalidade e da técnica legislativa empregada, oportunizando assim a continuidade de sua tramitação.
Até o presente momento os Autos são compostos de Minuta de Projeto Indicativo e despachos de encaminhamento para elaboração de Parecer Jurídico prévio.
O Projeto Indicativo de Lei, por sua vez, de autoria do ilustríssimo e emérito Vereador DR.º WILLIAM MIRANDA, tem como objeto a autorização da inclusão do nome do vereador autor do projeto nos textos das leis sancionadas e promulgadas, e nos decretos legislativos.
A justificativa[2] apresentada, pelo douto Vereador, se resume em acabar com o anonimato do trabalho funcional e ações realizadas pelos parlamentares.
Além disso, proporcionará aos cidadãos informações sobre as atividades dos seus representantes o que irá proporcionar e fomentar o exercício da cidadania.
Nestes termos, relatado o feito na forma dos parágrafos anteriores, passo a opinar.
2 - FUNDAMENTAÇÃO
2.1 – Natureza Jurídica do Parecer
O Parecer corresponde a manifestação enunciativa, com finalidade precípua de auxiliar tecnicamente a autoridade solicitante, possuindo, portanto, caráter estritamente opinativo e orientador, consoante disposto no Anexo VI, Item 7.1 da Lei Municipal nº.: 2.656/2003.
Quanto ao seu objeto, a análise se restringirá aos aspectos legais e documentações carreadas, até o presente momento, nos autos em testilha, não cabendo a este órgão se imiscuir em questões meritórias ou discricionárias do Ordenador de Despesas.
Em arremate, consignamos que a emissão do parecer não representa impedimento a eventuais consultas e análises jurídicas suscitadas supervenientemente pelas Comissões, Mesa Diretora ou Presidência desta Cassa Legislativa.
2.2 – Da Juridicidade e da Constitucionalidade
O controle de constitucionalidade consubstancia mecanismo importante à verificação da compatibilidade entre a lei ou qualquer ato normativo infraconstitucional à Carta Magna, apurando-se o fundamento de validade desta em face do ordenamento jurídico. Com relação ao tema, o autor Flávio Martins[3] apresenta um conceito elucidativo:
Controle de constitucionalidade consiste na verificação da compatibilidade das leis e dos atos normativos com a Constituição. Decorre da supremacia formal da Constituição sobre as demais leis do ordenamento jurídico de um país. Ora, se a Constituição é a lei mais importante do ordenamento jurídico, sendo o pressuposto de validade de todas as leis, para que uma lei seja válida precisa ser compatível com a Constituição. Caso a lei ou o ato normativo não seja compatível com a Constituição, será inválido, inconstitucional.
A própria Lei Orgânica Municipal (Lei nº.: 0/1990, art. 30, XI), de modo expresso, dispõe[4] o dever do Município ao respeito a constitucionalidade e a legalidade, nos seguintes termos:
Art. 30 - Compete ao Município da Serra:
[...]
XI - zelar pela guarda da Constituição Federal, da Constituição Estadual, desta Lei Orgânica, das leis e das instituições democráticas e conservar o patrimônio público;
Ultrapassada esta premissa, destaca-se que a aferição da constitucionalidade pode se dar sob o prisma material e formal.
O controle material de constitucionalidade é aquele que leva em consideração se conteúdo da matéria da proposição é de competência de determinado ente. Enquanto o controle formal visa aferir se o processo legislativo fora respeitado. É o entendimento da doutrina pátria[5], a seguir:
Há duas espécies de inconstitucionalidade por ação: material e formal.
a) Inconstitucionalidade material
Ocorre a inconstitucionalidade material quando o conteúdo da lei ou ato normativo fere a Constituição. Assim, se o conteúdo de uma lei violar as regras ou princípios constitucionais, poderá ser declarado inconstitucional, pelo vício material.
[...]
Se o conteúdo da lei violar regra ou princípio constitucional, será declarado materialmente inconstitucional.
b) Inconstitucionalidade formal
Ao contrário da inconstitucionalidade material, na qual o problema está no conteúdo da norma, na inconstitucionalidade formal, o problema, o vício, está no processo de criação da norma, na sua forma, portanto.
[...]
b.1) Inconstitucionalidade formal orgânica
Trata-se do vício de inconstitucionalidade decorrente da incompetência para elaboração da lei ou ato normativo. A Constituição Federal enumera a competência dos entes federativos.
[...]
b.2) Inconstitucionalidade formal propriamente dita
A inconstitucionalidade formal propriamente dita ocorre quando há um vício no processo de formação da lei (processo legislativo). O vício pode se dar em qualquer uma das fases desse processo. Primeiramente, pode ocorrer um vício de iniciativa.
b.3) Inconstitucionalidade formal por violação a pressupostos objetivos do ato normativo
[...]
Em algumas situações, a lei, ou ato normativo, é feita pela autoridade correta, legítima, respeita integralmente o seu procedimento de criação, mas não atende a um requisito objetivo externo.
2.2.1 – Da Constitucionalidade Material
Preliminarmente, impende destacar a importância dos princípios jurídicos para o Ordenamento.
Conforme as lições do emérito doutrinador Celso Antônio Bandeira de Mello[6], os princípios jurídicos constituem cerne do sistema jurídico e ao afrontá-los estão afrontando as bases que sustentam o próprio ordenamento jurídico, a seguir:
Princípio é, pois, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para exata compreensão e inteligência delas, exatamente porque define a lógica e a racionalidade do sistema normativo, conferindo-lhe a tônica que lhe dá sentido harmônico. Eis porque: violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio violado, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.
(Grifos apostos)
A Constituição Federal, Estadual e a Lei Orgânica do Município, sem prejuízo de outros preceitos igualmente aplicáveis, destacam princípios fundamentais para atividades estatais, a saber:
Constituição Federal
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
[...]
§ 1º A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.
(Grifos apostos)
Constituição Estadual
Art. 32 As administrações públicas direta e indireta de quaisquer dos Poderes do Estado e dos Municípios obedecerão aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, finalidade, interesse público, razoabilidade, proporcionalidade e motivação, e também aos seguintes:
(Grifos apostos)
Lei Orgânica Municipal (LC nº.: 0/1990)
Art. 31 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes do Município, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência e também ao seguinte:
Sob o prisma do controle material de constitucionalidade e de juridicidade, a matéria do Projeto Indicativo de Lei em tela padece de inconstitucionalidade e ilegalidade por contrariar o princípio republicano[7] e outros[8] derivados da sua inteligência como o da impessoalidade e o da moralidade, além da legislação infraconstitucional (LC nº.: 95/98).
Com relação aos princípios da impessoalidade e da moralidade, a doutrina os define da seguinte forma:
2.6.7 Princípio da impessoalidade[9]
[...]
2.6.7.1 Subprincípio da vedação da promoção pessoal
Desdobramento fundamental do princípio da impessoalidade é a vedação da promoção pessoal de agentes ou autoridades. A maior preocupação do legislador foi impedir que a propaganda dos atos, obras e programas do governo pudesse ter um caráter de pessoalidade por meio da associação entre uma realização pública e o agente público responsável por sua execução. A atuação deve ser impessoal também nesse sentido. Note que a impessoalidade é caminho de mão dupla. De um lado, o administrado deve receber tratamento sem discriminações ou preferências; de outro, o agente público não pode imprimir pessoalidade associando sua imagem pessoal a uma realização governamental. É o que prescreve o art. 37, § 1º, da Constituição Federal: “A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos”.
(Grifos apostos)
2.6.8 Princípio da moralidade[10]
[...]
2.6.8.1 Conteúdo jurídico da moralidade administrativa
[...]
A moralidade administrativa difere da moral comum. O princípio jurídico da moralidade administrativa não impõe o dever de atendimento à moral comum vigente na sociedade, mas exige respeito a padrões éticos, de boa-fé, decoro, lealdade, honestidade e probidade incorporados pela prática diária ao conceito de boa administração. Certas formas de ação e modos de tratar com a coisa pública, ainda que não impostos diretamente pela lei, passam a fazer parte dos comportamentos socialmente esperados de um bom administrador público, incorporando-se gradativamente ao conjunto de condutas que o Direito torna exigíveis.
(Grifos apostos)
Dessa forma, o parlamentar não atua em nome próprio ou como mera pessoa física no desempenho da atividade legiferante, mas como procurador e representante do povo para consecução dos interesses destes.
Assim, urge o dever de atuação sob a premissa do princípio republicano, da impessoalidade e da moralidade
Por isso, é vedada toda publicidade estatal que vise promoção pessoal utilizando dos meios e recursos públicos, sejam eles atos, programas, obras, serviços e campanhas de órgãos públicos (CRFB, art.37, §1º).
Deve se destacar, outrossim, que o nome do Prefeito e do Vice-Prefeito ou Presidente da Câmara (em caso de promulgação pela Mesa da Câmara dos Vereadores) nas leis ou emendas promulgadas não são inconstitucionais porque essa possibilidade encontra-se prevista na própria Constituição (princípio da simetria) e para situação bem específica (CRFB, art. 66, §7º e 60, §3º).
Ademais, uma lei aprovada pelo Legislativo é uma união de esforços, uma construção em conjunto entre os parlamentares, não algo individual e particular do proponente.
A jurisprudência pátria já se manifestou na inconstitucionalidade de leis com objetos análogos ao da Proposição em comento, in litteris:
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJ/RS):
Ação Direta de Inconstitucionalidade
Órgão Especial nº.: 70022574420
Comarca de Porto Alegre;
PROPONENTE: PROCURADOR-GERAL DE JUSTICA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
REQUERIDA: CÂMARA MUNICIPAL DE VEREADORES DE MARAU
REQUERIDO: MUNICIPIO DE MARAU
Ementa: Ação direta de inconstitucionalidade. Lei municipal nº 4.193/2007. Município de Marau. Inscrição do nome dos autores dos projetos de leis na lei promulgada. VIOLAÇÃO ÀS NORMAS DA IMPESSOALIDADE E DA PUBLICIDADE.
A Lei Municipal que obriga a veiculação do nome dos edis responsáveis pelo projeto de lei aprovado, no texto da Lei aprovada, viola as normas da publicidade e da impessoalidade (art. 19, caput, e § 1º da Constituição Estadual, além do art. 37 da Constituição da República).
As funções públicas – de natureza transitória e finalisticamentes determinadas pela Constituição – não se destinam à promoção pessoal dos eventuais ocupantes dos cargos públicos.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA PROCEDENTE.
VOTOS
Des. Adão Sérgio do Nascimento Cassiano (RELATOR)
“Deve ser deferido o pedido liminar para suspender a vigência da Lei Municipal nº 4.193/2007, nos seus arts. 1º e 2º, por afronta aos princípios constitucionais da impessoalidade e da finalidade da publicidade dos atos legislativos, que derivam do princípio republicano.
[...]
O legislador municipal, no exercício de suas funções, deve ater-se à realização das finalidades constitucionais para as quais restou eleito democraticamente, sem se valer da função para a promoção pessoal ou para divulgação do seu trabalho – que no fundo não é mais do que o cumprimento do seu dever. Função pública é o exercício do feixe de deveres-poderes impostos pelas Constituições Estadual e Federal, entre os quais o dever-poder de legislar.
[...]
Agente público, neste caso, inclui-se em conceito mais amplo, que engloba os agentes políticos do Legislativo, no caso, os edis de Marau.
Portanto, há clara violação à norma da impessoalidade, quando a Lei Municipal de Marau determina que haja a publicação dos autores do projeto de lei, quando da publicação da lei respectiva.
A publicidade de nomes, nestes casos, deve-se cingir àqueles nomes constitucionalmente determinados, quais sejam, do Presidente da Câmara (em caso de promulgação pela Mesa da Câmara) ou do Prefeito Municipal, sob pena de afronta à impessoalidade.
[...]
A publicidade de nomes, nestes casos, deve-se cingir àqueles nomes constitucionalmente determinados, quais sejam, do Presidente da Câmara (em caso de promulgação pela Mesa da Câmara) ou do Prefeito Municipal, sob pena de afronta à impessoalidade.
[...]
Portanto, a publicidade dos atos oficiais – neles incluídos os textos legislativos – tem cunho de divulgação geral e irrestrita do conteúdo normativo, tal como também preleciona o art. 37, § 1º, da Constituição da República.
[...]
Eles (os agentes políticos) não podem pretender a auto-promoção, com a apresentação de seus nomes nas legislações editadas, porque apresentaram o projeto de lei, transformado em Lei.
Em primeiro lugar, as leis – e não os seus autores – têm a pretensão de durabilidade, de estabilidade, de permanência no tempo. Após aprovadas, a Lei recebe um número para que seja identificada por este número.
[...]
Em segundo lugar, a Constituição não é modificada pela conduta, ilegal e inconstitucional, perpetrada por outros Municípios, que também incluem em suas leis os nomes dos edis responsáveis pela apresentação do projeto de lei. Melhor dizendo, em linguagem direta, a inconstitucionalidade praticada por outros Municípios, generalizadamente, não convalida ou justifica a inconstitucionalidade da lei do Município de Marau, ora em discussão.
[...]
A atividade parlamentar não é, ou não deveria ser, controlada ou avaliada unicamente com base no número de leis, ou projetos de leis apresentados e aprovados. A realização das finalidades constitucionais e legais, impostas ao Legislativo Municipal, não depende apenas de aprovação de leis. Também necessita da atividade de fiscalização do Executivo, de atendimento às demandas da população, através da discussão do orçamento, do controle dos gastos internos da Câmara, dentre outras.
A presença do nome do Prefeito, nas Leis aprovadas, igualmente não se destina – ou não deveria se destinar – ao engrandecimento da popularidade do agente político. Ao contrário, consta lá para que seja pública e notória a sanção do Projeto de lei, indispensável ao processo legislativo ordinário (art. 66 da Constituição da República Federativa do Brasil). E, saliente-se, quando a iniciativa é do Prefeito, também o seu nome não consta como se fora o “autor do projeto”.
(Grifos apostos)
TJ/RS:
Ação Direta de Inconstitucionalidade
Órgão Especial nº.: 70017250796
Comarca de Porto Alegre;
PROPONENTE: PREFEITO MUNICIPAL DE URUGUAIANA
REQUERIDO: CAMARA MUNICIPAL DE VEREADORES DE URUGUAIANA
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGOS 7º E SEUS PARÁGRAFOS, 8º E 10, DA LEI MUNICIPAL Nº 3.610/2006, DE URUGUAIANA, QUE ESTABELECE NORMAS E CONDIÇÕES AO FUNCIONAMENTO DAS FARMÁCIAS E DROGARIAS NA CIRCUNSCRIÇÃO DO MUNICÍPIO. MATÉRIA PRIVATIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. ARTIGO 60, II, LETRA ‘D’, DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. VÍCIO FORMAL DE INICIATIVA. REFLEXO NAS CONTAS PÚBLICAS. EVIDENTE AUMENTO DE DESPESA SEM PRÉVIA DEFINIÇÃO ORÇAMENTÁRIA. ARTIGOS 8º, 10, 149 E 154, I, DA CE.
PREÂMBULO DA NORMA. IDENTIFICAÇÃO DO NOME DO VEREADOR AUTOR DO RESPECTIVO PROJETO. OFENSA AO PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE. VÍCIO DE INCONSTITUCIONALIDADE POR AFRONTA AO ART. 19, CAPUT E § 1º, DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO. INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL E FORMAL.
AÇÃO JULGADA PROCEDENTE.
TJ/RS:
Ação Direta de Inconstitucionalidade
Tribunal Pleno nº.: 70008125072
Comarca de Porto Alegre;
PROPONENTE: DÉLCIO HUGENTOBLER (Prefeito Municipal de Taquara)
REQUERIDO: CÂMARA MUNICIPAL DE VEREADORES DE TAQUARA
ADIn. TAQUARA. OBRIGATORIEDADE DE MENÇÃO DO NOME DO AUTOR DO PROJETO DE LEI POR OCASIÃO DA SANÇÃO OU PROMULGAÇÃO. PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE.
Afeta o adotado princípio da impessoalidade, norma jurídica municipal que impõe a menção ao nome do vereador que deu origem ao projeto de lei, porquanto, assim na administração como na legislação, o que deve prevalecer é o "sentido de função".
Ação a que se julga procedente.
VOTO
Des. Antonio Janyr Dall´Agnol Junior (RELATOR)
[...]
O processo legislativo tem início por ação de alguém, mas nem por isso o resultado pode-lhe ser creditado por inteiro, na medida em que é a legislativa atividade essencialmente colegiada, para ficarmos apenas com a que se desenvolve no parlamento.
Assinalar-se, quando da publicação da lei, quem tenha sido o autor do projeto que lhe deu origem, soa como publicidade pessoal, sem nenhum proveito público.
[...]
Na doutrina, colhe-se serem “os atos e provimentos administrativos (são) imputáveis não ao funcionário que os pratica, mas ao órgão ou entidade administrativa da Administração Pública, de sorte que ele é o autor institucional do ato. Ele é apenas o órgão que formalmente manifesta a vontade estatal” (JOSÉ AFONSO DA SILVA, Curso de Direito Constitucional Positivo, 1989, p. 562).
[...]
Vai meu voto, destarte, pela procedência desta ação, decretando-se a inconstitucionalidade da Lei 3.120, de 19.9.03, do Município de Taquara.
(Grifos apostos)
E. Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ/MT):
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – MEDIDA ACAUTELATÓRIA – LEI Nº 1.490/2014, DO MUNICÍPIO DE PRIMAVERA DO LESTE – OBRIGATORIEDADE DE MENÇÃO, POR OCASIÃO DA PUBLICAÇÃO NO DIÁRIO OFICIAL, DO PARLAMENTAR AUTOR DA PROPOSIÇÃO LEGISLATIVA APROVADA – INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL – AUSÊNCIA DE “INTERESSE LOCAL” E SUPLEMENTAÇÃO DAS LEGISLAÇÕES FEDERAL E ESTADUAL – PESSOALIDADE – DESPROPORCIONALIDADE DO MEIO – SUSPENSÃO LIMINAR DA EFICÁCIA DA LEI MUNICIPAL IMPUGNADA.
É materialmente inconstitucional norma municipal que cria a obrigatoriedade de menção, por ocasião da publicação no Diário Oficial, do parlamentar autor da proposição legislativa aprovada. Inteligência dos arts. 37, p. ú., 129, “caput” e §1º, e 193 da Constituição do Estado, dos princípios da publicidade, impessoalidade e proporcionalidade, e de precedentes do TJRS. Suspensão liminar deferida.
(N.U 0137789-39.2015.8.11.0000, JOÃO FERREIRA FILHO, TRIBUNAL PLENO, Julgado em 26/11/2015, Publicado no DJE 02/12/2015)
(Grifos apostos)
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – LEI Nº 1.490/2014, DO MUNICÍPIO DE PRIMAVERA DO LESTE – OBRIGATORIEDADE DE MENÇÃO, POR OCASIÃO DA PUBLICAÇÃO NO DIÁRIO OFICIAL, DO PARLAMENTAR AUTOR DA PROPOSIÇÃO LEGISLATIVA APROVADA – INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL – AUSÊNCIA DE “INTERESSE LOCAL” E SUPLEMENTAÇÃO DAS LEGISLAÇÕES FEDERAL E ESTADUAL – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE – DESPROPORCIONALIDADE DO MEIO – NORMA DECLARADA INCONSTITUCIONAL COM EFEITOS “EX NUNC”.
É materialmente inconstitucional norma municipal que cria a obrigatoriedade de menção, por ocasião da publicação no Diário Oficial, do parlamentar autor da proposição legislativa aprovada. Inteligência dos arts. 37, p. ú., 129, “caput” e §1º, e 193 da Constituição do Estado, dos princípios da publicidade, impessoalidade e proporcionalidade.
(N.U 0137789-39.2015.8.11.0000, JOÃO FERREIRA FILHO, TRIBUNAL PLENO, Julgado em 13/10/2016, Publicado no DJE 28/10/2016)
(Grifos apostos)
Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJ/SC):
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - CONTROLE CONCENTRADO - LEI MUNICIPAL N. 2.354/2006 - INSERÇÃO DO NOME DO AUTOR DO PROJETO DE LEI NA LEX PROMULGADA - PROMOÇÃO PESSOAL - VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE - PECHA DE INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA - PROCEDÊNCIA DO PEDIDO
Os detentores de mandato eletivo não podem se utilizar das funções públicas a que foram submetidos por sufrágio universal para o fim de auto-promoção. "A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e as campanhas dos órgãos e entidades da administração pública, ainda que não custeadas diretamente por esta, deverão ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, delas não podendo constar símbolos, expressões, nomes ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos" (art. 16, § 6º, da CESC).
(TJSC, Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2006.019716-7, de Palhoça, rel. Fernando Carioni, Tribunal Pleno, j. 19-11-2008).
Com isso, visando resguardar a Constituição, leis infraconstitucionais, a própria Câmara de Vereadores de Serra/ES e o interesse de todos os seus parlamentares, conclui-se que o Projeto Indicativo nº.: 43/2022 é materialmente inconstitucional.
Ad argumentandum tantum, o objeto da Proposição em epígrafe já fora objeto do Parecer nº.: 1073/2021 desta Procuradoria no Projeto de Lei nº.: 292/2021, processo nº.: 6.195/2021, onde destaca-se a seguinte parte, in verbis:
Contudo, passando ao outro ponto, isto é, à verificação da constitucionalidade do Projeto, não identifico a mesma sorte na proposta de lei em análise. Isto porque, ao autoriza a inclusão no texto das Leis sancionadas e promulgadas e nos Decretos Legislativos o nome do Vereador autor do projeto, acaba por violar o artigo 3º, I da Lei Complementar 95/98.
Portanto, além da inconstitucionalidade verificada, evidencia-se, igualmente, a ilegalidade do Projeto Indicativo de Lei nº.: 43/2022.
2.3 – Da Técnica Legislativa
Em relação a técnica legislativa aplicada à Minuta, verifica-se que preencheu as principais diretrizes da Lei Complementar nº.: 95/98 e da Resolução Municipal nº.: 278/2020.
Além disso, após consulta ao sítio eletrônico desta Casa, essa Proposição não se encontra rejeitada nesta Sessão Legislativa, não incidindo, a princípio, o óbice previsto no artigo 67 da CF.
3 - CONCLUSÃO
Ante o exposto, OPINA esta Procuradoria pelo NÃO PROSSEGUIMENTO do Projeto Indicativo de Lei nº.: 43/2022 porquanto é materialmente inconstitucional e contrário à LC nº.: 95/1998.
Salienta-se que o presente Parecer não avaliou a oportunidade e conveniência da matéria, eis que é exclusiva do Vereador proponente, não cabendo a esta Procuradoria sobre ela emitir juízo de valor.
Esses são os esclarecimentos que formam nosso parecer.
À consideração superior.
Serra/ES, 01 de novembro de 2022.
FERNANDO CARLOS DILEN DA SILVA
Procurador
Matrícula 4073096
LEANDRO PALHONI MAGEVISKI
Assessor Jurídico
Nº Funcional 4125029-00
[1] Art. 117 São modalidades de proposição:
[...]
XVII – os projetos indicativos;
Art. 139 As proposições constantes nos incisos I, II, III, IV, V, IX, XI, XII, XIV e XVI do art. 117, serão protocolizadas e submetidas pela Presidência à Procuradoria, no prazo de 05 dias úteis, para análise jurídica preliminar.
Parágrafo único. Nos casos de proposições submetidas ao regime de urgência especial, a Procuradoria será instada a se manifestar de imediato.
[2] Art. 122, III da Resolução nº.: 278/2020
[3] MARTINS, Flávio. Curso de Direito Constitucional. 3ª ed. São Paulo, SP: SaraivaJur. 2019.
[4] De igual forma os artigos 29 e 20 da Constituição Federal e Estadual, respectivamente:
Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:
Art. 20 - O Município rege-se por sua lei orgânica e leis que adotar, observados os princípios da Constituição Federal e os desta Constituição.
(Grifos apostos)
[5] Idem.
[6] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 27ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2010. Página 53.
[7] O princípio republicano, previsto no artigo 1º da Constituição Federal, se consubstancia na legitimidade popular do Presidente da República (CRFB, art. 77 e 82), dos Governadores de Estados (CRFB, art. 28), dos Prefeitos Municipais (CRFB, 29, I) e do Governador do DF (CRFB, 32, §2º), na responsabilidade dos representantes, eleições periódicas por tempo determinado (temporariedade dos mandatos eletivos) e à consequente não vitaliciedade dos cargos políticos. Isto é, na eletividade, a periodicidade e a responsabilidade.
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
[...]
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
[8] 2.2.6 Princípio republicano
[...]
Também por isso, há que distinguir – a despeito de seus importantes pontos de contato e a exemplo do que ocorre com o Estado Federal e o federalismo – entre a República como forma de governo e o republicanismo (ou princípio republicano), como conjunto de valores e princípios que norteiam a República em seus traços essenciais.
(Grifos apostos)
SARLET, Ingo Wolfganga. & Outros. Curso de Direito Constitucional. 7ª.Ed. São Paulo: Saraiva, 2018.
[9] OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Curso de Direito Administrativo. 6ª Ed. São Paulo: Forense, 2018.
[10] MAZZA, Alexandre. Manual de Direito Administrativo. 8ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2018.
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