Recebimento: 09/03/2023 |
Fase: Emitir Parecer |
Setor:Procuradoria |
Envio: 04/04/2023 10:25:32 |
Ação: Parecer Emitido
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Tempo gasto: 25 dias, 19 horas, 37 minutos
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Complemento da Ação:
PROCESSO Nº: 4068/2022
PROJETO DE LEI Nº: 284/2022
Requerente: Vereador Prof. Artur
Assunto: Projeto de Lei que Dispõe Sobre a Obrigatoriedade de as Escolas Públicas e Privadas de Educação Básica Contarem com Serviço de Vigilância Patrimonial.
Parecer nº: 175/2023
PARECER DA PROCURADORIA GERAL
RELATÓRIO
Cuidam os autos de Projeto de Lei de autoria do ilustre Vereador Prof. Artur que Dispõe Sobre a Obrigatoriedade de as Escolas Públicas e Privadas de Educação Básica Contarem com Serviço de Vigilância Patrimonial.
Diante disso, a Presidência desta Casa de Leis encaminhou-nos o processo para a necessária averiguação de sua constitucionalidade e do interesse público em sua realização, com conseqüente emissão de Parecer.
Nestes termos, relatado o feito na forma dos parágrafos anteriores, passo a opinar.
FUNDAMENTAÇÃO
Inicialmente, cumpre esclarecer que, conforme prescreve o art. 145, da Lei Orgânica do Município da Serra, a elevação de um Projeto ao patamar de Lei Municipal passa sempre pela comprovação de dois requisitos indispensáveis, quais sejam, a constitucionalidade e o interesse público em sua realização.
Pois bem. No caso em tela, entendo configurado o interesse público no Projeto de Lei em referência. Isso porque, conforme restou demonstrado na Justificativa foi também corroborado pela assessoria técnico-legislativa em sua avaliação, o comando normativo que emerge da proposição tem a finalidade de contribuir com o processo educativo, o controle da segurança é importante para preservar a estrutura física do estabelecimento, além de proteger alunos, profissionais de educação e quaisquer outros agentes que esteja na escola.
Com efeito, conforme de conhecimento geral, os esforços para reduzir a violência crescente a que tem sido submetida a população é cada vez maior por parte da sociedade, através da conscientização, reeducação de hábitos e mudança de posturas, e do Poder Público, através do desenvolvimento de ações e programas adequados.
Nesse contexto, o Projeto de Lei tem como finalidade tornar obrigatório á todas as escolas públicas e privadas do município da serra, a presença de vigilância patrimonial para atender às questões de segurança do estabelecimento escolar.
Diante disso, inquestionável o interesse público na edição da norma proposta, na medida em que contribui para elidir possíveis crimes que ocorram dentro das escolas públicas e privadas, conferindo maior segurança aos alunos e profissionais.
Assim sendo, tenho por identificado e reconhecido o requisito interesse público no caso dos autos.
Prosseguindo, no que diz respeito à constitucionalidade do Projeto de Lei em análise, infelizmente posso afirmar a mesma sorte verificada quesito anterior, tendo em vista o vício de que padece a proposição, por conta da competência privativa da União para legislar sobre a matéria nela abrigada.
Há que se reconhecer que ao dispor acerca da instituição de um serviço compulsório para todo um setor escolar que atua na Serra, o Projeto extrapola a competência legislativa reservada ao Município. Isso porque a competência para legislar sobre as relaçoes de consumo, como aquela de que trata a proposição em tela, é exclusiva da União, conforme deflui da inteligência do art. 22, I, da Constituição Federal, sendo portanto vedado aos municípios brasileiros editar leis que usurpem essa reserva legislativa.
Além disso, é importante ressaltar que nos moldes em que se encontra redigido o texto legal proposto confronta com o capítulo constitucional dedicado aos princípios gerais da ordem econômica, que prima pela liberdade concedida à iniciativa privada, especialmente no art. 174 da Carta Magna, pelo qual o planejamento estatal da economia é obrigatório para o setor público, mas não para o setor privado. Senão vejamos:
“Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.”
Conforme se observa, o artigo, além de estabelecer como regra a não intervenção na iniciativa privada, ainda prescreve que as intervenções possíveis deverão ser feitas na forma da Lei, referindo-se, obviamente, à legislação Federal, de forma a vedar aos municípios a possibilidade de lançar mão de tal artifício.
Não obstante, outro ponto que indica a inconstitucionalidade do Projeto de Lei em estudo, é o fato de que a edição da norma violentará o princípio da livre concorrência, valor que a Constituição da Repúplica erigiu como um dos fundamentos da ordem econômica brasileira, conforme se pode notar do dispositivo constitucional a seguir transcrito:
“Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...)
IV - livre concorrência; (...)”
Com efeito, implantando-se a obrigatoriedade prevista no Projeto de Lei os serviços prestados pelas agências bancárias e supermercados no Município da Serra não serão mais aqueles ditados pelas regras concorrenciais, que, em razão da seletividade da demanda obrigam os empresários a refinar os serviços que oferecem, mas por uma imposição legal, contrariando frontalmente o princípio constitucional da livre concorrência.
Importante consignar, nesse pormenor, que várias decisões dos tribunais pátrios já reconheceram a inconstitucionalidade de leis com o mesmo espírito, conforme se colhe do seguinte aresto, que trago à baila a título ilustrativo:
COMPETÊNCIA LEGISLATIVA. ADI. LEI ESTADUAL QUE ESTABELECE MEDIDAS DE SEGURANÇA EM ESTACIONAMENTOS. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. A Lei Estadual 1.748/1990, que impõe medidas de segurança em estacionamento, é inconstitucional, quer por invadir a competência privativa da União para legislar sobre direito civil ( CF/88 , art. 22 , I ), conforme jurisprudência consolidada nesta Corte, quer por violar o princípio da livre iniciativa ( CF/88 , art. 170 , par. único, e art. 174 ), conforme entendimento pessoal deste relator, expresso quando do julgamento da ADI 4862 , rel. Min. Gilmar Mendes. 2. O artigo 1º da lei impugnada, ao obrigar tais empresas à manutenção de empregados próprios nas entradas e saídas dos estacionamentos, restringe a contratação de terceirizados, usurpando, ainda, a competência privativa da União para legislar sobre direito do trabalho ( CF/88 , art. 22 , I ). 3. Ação julgada procedente. 4. Tese: 1. “Lei estadual que impõe a prestação de serviço segurança em estacionamento a toda pessoa física ou jurídica que disponibilize local para estacionamento é inconstitucional, quer por violação à competência privativa da União para legislar sobre direito civil, quer por violar a livre iniciativa.” 2. “Lei estadual que impõe a utilização de empregados próprios na entrada e saída de estacionamento, impedindo a terceirização, viola a competência privativa da União para legislar sobre direito do trabalho.” (ADI 451, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 01/08/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-045 DIVULG 08-03-2018 PUBLIC 09-03-2018)
É bom destacar, que proposta de conteúdo análogo à que se analisa já foi veiculada por esta Câmara Municipal através do Autógrafo de Lei nº 3190/2008, de autoria do Vereador Antônio Fernandes de Aquino, tendo sido contudo vetada na integra pelo Prefeito Municipal por meio da Mensagem nº 007/2008, Veto que foi oportunamente acolhido por este Poder Legislativo.
Assim, como se colhe de todo o exposto, inafastável a conclusão de que o Projeto de Lei analisado, ao legislar sobre matéria cuja competência legislativa pertence à União, incide em inconstitucionalidade material e viola princípio da autonomia política, administrativa e legislativa dos entes federados, esculpido no artigo 18 da Constituição Federal brasileira.
Diante disso, ainda que reconhecendo os elevados valores que imbuíram a proposição da norma, pelos quais congratulo o ilustre Parlamentar Prof. Artur, não há como endossar o Projeto de Lei em avaliação, tendo em vista as inconformidades apontadas.
CONCLUSÃO
Posto isso, firmada em todas as razões e fundamentos já expostos, opina esta Procuradoria pelo NÃO prosseguimento do Projeto de Lei nº 284/2022, haja vista que invade competência delegada à União Federal (artigo 22, XXVII CF/88), motivo pelo qual sugiro seu arquivamento, sem embargos de eventual análise jurídica sobre o mérito da presente matéria, em caso de solicitação pelas Comissões Competentes, Mesa Diretora e Presidência ou outras questões não abordadas neste parecer.
Ressaltamos que o presente Parecer é de natureza opinativa e não vinculatório, de modo que, todos aqueles participantes do processo, em especial o gestor público, dentro da margem de discricionariedade, juízo de valor e ação que lhes são conferidos, deverão diligenciar pela observância dos princípios e normas constitucionais e infraconstitucionais no caso em destaque.
Destarte, ressaltamos que, incumbe a esta Procuradoria Geral prestar consultoria sob o prisma estritamente jurídico, não lhe competindo adentrar nas razões e pertinência temática do projeto, motivo pelo qual o presente posicionamento não contém natureza vinculativa e sim opinativa, não vinculando o posicionamento desta Procuradoria para outras situações concretas, ainda que parecidos a este projeto.
Esses são os esclarecimentos que formam nosso parecer que submetemos à apreciação Superior, motivo pelo qual ENCAMINHAMOS os autos à Presidência.
Serra/ES, 04 de abril de 2023.
FERNANDO CARLOS DILEN DA SILVA
Procurador
Nº Funcional 4073096
VANESSA BRANDES FARIA
Assessora Jurídica
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Documento(s) da tramitação:
Despacho Digital
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