Complemento da Ação: PROCESSO Nº.: 2.337/2022
PROJETO INDICATIVO Nº.: 41/2022
REQUERENTE: Vereador Igor Elson
ASSUNTO: Projeto Indicativo que dispõe sobre a obrigatoriedade das escolas públicas e privadas, estabelecidas no Município de Serra/ES, a elaborar o Plano de Abandono de Área em Situações de Risco.
PARECER Nº.: 601/2022
EMENTA: Escolas. Rede Pública e Privada. Situação de Emergência. Plano de Abandono (evacuação). Defesa Civil. Interesse Local. Iniciativa do Executivo. Competência Suplementar. Constitucionalidade. Prosseguimento.
PARECER PRÉVIO DA PROCURADORIA GERAL
1 - RELATÓRIO
A eminente Presidência desta Casa Legislativa encaminhou-nos, consoante disposição do artigo 139 c/c artigo 117, inciso XVII, da Resolução Municipal nº.: 278/2020[1], o Processo em epígrafe para análise e emissão do respectivo Parecer Jurídico, com a apreciação de sua juridicidade, legalidade, constitucionalidade e da técnica legislativa empregada, oportunizando assim a continuidade de sua tramitação.
Até o presente momento os Autos são compostos de Minuta de Projeto Indicativo (fls.1/2), Justificativa (fls.3) e despachos, incluindo o de encaminhamento para elaboração de Parecer Jurídico prévio (fls.4/5).
O Projeto Indicativo de Lei, por sua vez, de autoria do ilustríssimo e emérito Vereador IGOR ELSON, tem como objeto a obrigatoriedade das escolas públicas e privadas, estabelecidas no Município de Serra/ES, a elaborar o Plano de Abandono de Área em Situações de Risco.
A justificativa[2] apresentada, pelo douto Vereador, se resume na necessidade de preparar um plano de abandono para situações de risco e emergência nas escolas sediadas no Municípios, sejam elas públicas ou privadas, uma vez que ocupam esses estabelecimentos, na sua maioria, crianças e adolescentes que não possuem maturidade e correta percepção dos riscos envolvidos.
Nestes termos, relatado o feito na forma dos parágrafos anteriores, passo a opinar.
2 - FUNDAMENTAÇÃO
2.1 – Natureza Jurídica do Parecer
O Parecer corresponde a manifestação enunciativa, com finalidade precípua de auxiliar tecnicamente a autoridade solicitante, possuindo, portanto, caráter estritamente opinativo e orientador, consoante disposto no Anexo VI, Item 7.1 da Lei Municipal nº.: 2.656/2003.
Quanto ao seu objeto, a análise se restringirá aos aspectos legais e documentações carreadas, até o presente momento, nos autos em testilha, não cabendo a este órgão se imiscuir em questões meritórias ou discricionárias do Ordenador de Despesas.
Em arremate, consignamos que a emissão do parecer não representa impedimento a eventuais consultas e análises jurídicas suscitadas supervenientemente pelas Comissões, Mesa Diretora ou Presidência desta Cassa Legislativa.
2.2 – Da Juridicidade e da Constitucionalidade
O controle de constitucionalidade consubstancia mecanismo importante à verificação da compatibilidade entre a lei ou qualquer ato normativo infraconstitucional à Carta Magna, apurando-se o fundamento de validade desta em face do ordenamento jurídico. Com relação ao tema, o autor Flávio Martins[3] apresenta um conceito elucidativo:
Controle de constitucionalidade consiste na verificação da compatibilidade das leis e dos atos normativos com a Constituição. Decorre da supremacia formal da Constituição sobre as demais leis do ordenamento jurídico de um país. Ora, se a Constituição é a lei mais importante do ordenamento jurídico, sendo o pressuposto de validade de todas as leis, para que uma lei seja válida precisa ser compatível com a Constituição. Caso a lei ou o ato normativo não seja compatível com a Constituição, será inválido, inconstitucional.
A própria Lei Orgânica Municipal (Lei nº.: 0/1990, art. 30, XI), de modo expresso, dispõe o dever do Município ao respeito a constitucionalidade e a legalidade, nos seguintes termos:
Art. 30 - Compete ao Município da Serra:
[...]
XI - zelar pela guarda da Constituição Federal, da Constituição Estadual, desta Lei Orgânica, das leis e das instituições democráticas e conservar o patrimônio público;
Ultrapassada esta premissa, destaca-se que a aferição da constitucionalidade pode se dar sob o prisma material e formal.
O controle material de constitucionalidade é aquele que leva em consideração se conteúdo da matéria da proposição é de competência de determinado ente. Enquanto o controle formal visa aferir se o processo legislativo fora respeitado. É o entendimento da doutrina pátria[4], a seguir:
Há duas espécies de inconstitucionalidade por ação: material e formal.
a) Inconstitucionalidade material
Ocorre a inconstitucionalidade material quando o conteúdo da lei ou ato normativo fere a Constituição. Assim, se o conteúdo de uma lei violar as regras ou princípios constitucionais, poderá ser declarado inconstitucional, pelo vício material.
[...]
Se o conteúdo da lei violar regra ou princípio constitucional, será declarado materialmente inconstitucional.
b) Inconstitucionalidade formal
Ao contrário da inconstitucionalidade material, na qual o problema está no conteúdo da norma, na inconstitucionalidade formal, o problema, o vício, está no processo de criação da norma, na sua forma, portanto.
[...]
b.1) Inconstitucionalidade formal orgânica
Trata-se do vício de inconstitucionalidade decorrente da incompetência para elaboração da lei ou ato normativo. A Constituição Federal enumera a competência dos entes federativos.
[...]
b.2) Inconstitucionalidade formal propriamente dita
A inconstitucionalidade formal propriamente dita ocorre quando há um vício no processo de formação da lei (processo legislativo). O vício pode se dar em qualquer uma das fases desse processo. Primeiramente, pode ocorrer um vício de iniciativa.
b.3) Inconstitucionalidade formal por violação a pressupostos objetivos do ato normativo
[...]
Em algumas situações, a lei, ou ato normativo, é feita pela autoridade correta, legítima, respeita integralmente o seu procedimento de criação, mas não atende a um requisito objetivo externo.
2.2.1 – Da Constitucionalidade Material
Sob o prisma do controle material de constitucionalidade e de legalidade, a matéria do Projeto Indicativo de Lei em tela não fere os princípios constitucionais, nem a legislação infraconstitucional.
2.2.2 – Da Constitucionalidade Formal
Quanto a constitucionalidade formal orgânica, a Constituição Federal prevê ser de competência legislativa dos municípios o poder de complementar (poder suplementar) a legislação federal e estadual para ajustar a sua execução às particularidades locais. Nesse mister legislativo, a lei municipal não poderá contrariá-las e deverá estar adstrita ao interesse local, requisito da repartição de competências dos municípios.
Esse raciocínio decorre da própria Legislação Pátria, mais precisamente da Constituição Federal (art.30, I e II), da Constituição Estadual (art.28, I e II) e da Lei Orgânica Municipal (Lei nº.: 0/1990, art. 30, I e II), a saber:
Constituição Federal:
Art. 30. Compete aos Municípios:
I - legislar sobre assuntos de interesse local;
II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;
Constituição Estadual:
Art. 28. Compete ao Município:
I - legislar sobre assunto de interesse local;
II - suplementar a legislação federal e estadual no que couber;
Lei Orgânica Municipal:
Art. 30. Compete ao Município da:
I - legislar sobre assuntos de interesse local;
II - Suplementar a legislação federal e estadual, no que couber;
Dessa forma, não sendo a matéria de competência exclusiva ou privativa da União e/ou Estados, exceto nos casos em que cabe à União somente editar normas gerais (CRFB, art. 22, XXI e XXVII), poderá o Município realizar a suplementação legislativa, desde que haja interesse local e não seja conflitante com lei federal ou estadual.
Trata-se de um poder derivado do artigo 18 da Constituição Federal[5], no qual os Entes Federativos possuem autonomia para a sua organização político-administrativa, conforme lições[6] a seguir:
A autonomia é o poder atribuído aos entes federativos, constitucionalmente assegurado. Implica o poder de auto-organização, dentro dos limites constitucionais, de cada ente federativo, ou seja, um poder governamental próprio, político e administrativo. Para que a autonomia se concretize, é necessário que o ente federativo possua competências e rendas próprias.
O Projeto Indicativo de Lei nº.: 41/2022, consoante discrimina o artigo 1º da Minuta de Projeto de Lei, demonstra ser matéria passível de suplementação, eis que não se pretende legislar sobre normas gerais, além de ser afeta ao interesse local e por tratar de normas de natureza administrativa[7] aplicáveis à área da segurança pública (defesa civil), além da matéria tratada não se encontrar no rol daquelas de competência legislativa exclusiva ou privativa da União e/ou dos Estados.
Ademais, a competência para iniciativa da lei é privativa do Poder Executivo (princípio da reserva da Administração) por se tratar de uma norma referente a organização administrativa na área da defesa civil, adentrando, assim, no elenco das competências privativas dispostas no inciso V do parágrafo único do artigo 143 da Lei Municipal nº.: 0/1990, in verbis:
Art. 143 - A iniciativa das leis compete a qualquer Vereador ou Comissão da Câmara Municipal, ao Prefeito Municipal, e aos cidadãos na forma e nos casos previstos nesta Lei Orgânica.
Parágrafo Único. São de iniciativa privativa do Prefeito as leis que disponham sobre:
[...]
V - criação, estruturação e atribuições das Secretarias Municipais e órgãos do Poder Executivo;
(Grifos apostos)
Dessa forma, a proposição, ora analisada, é constitucional e legal por ser uma recomendação da Câmara Legislativa para que o Poder Executivo deflagre o início do processo legislativo sobre matéria de sua competência, não usurpando sua competência, conforme regulamentou a Resolução Municipal nº.: 278/2020 no artigo 136, a saber:
Art. 136 O Projeto Indicativo é a recomendação da Câmara Municipal da Serra ao Poder Executivo local, no sentido de que este promova a abertura de processo legislativo que verse sobre matéria de sua competência.
Parágrafo único. Os Projetos Indicativos terão a forma de Minuta de Projeto de Lei.
(Grifos apostos)
Significa que a Recomendação respeita a legitimidade do Poder Executivo para deflagrar a iniciativa de lei cuja matéria é de sua competência e segundo sua discricionariedade.
2.3 – Da Técnica Legislativa
Em relação a técnica legislativa aplicada à Minuta, verifica-se que preencheu as principais diretrizes da Lei Complementar nº.: 95/98 e da Resolução Municipal nº.: 278/2020.
Além disso, após consulta ao sítio eletrônico desta Casa, essa Proposição não se encontra rejeitada nesta Sessão Legislativa, não incidindo, a princípio, o óbice previsto no artigo 67 da CF.
3 - CONCLUSÃO
Ante o exposto, OPINA esta Procuradoria pelo PROSSEGUIMENTO do Projeto Indicativo de Lei nº.: 41/2022, eis que se encontra em conformidade com a Magna Carta e a legislação infraconstitucional.
Salienta-se que o presente Parecer não avaliou a oportunidade e conveniência da matéria, eis que é exclusiva do Vereador proponente, não cabendo a esta Procuradoria sobre ela emitir juízo de valor.
Esses são os esclarecimentos que formam nosso parecer.
À consideração superior.
Serra/ES, 04 de novembro de 2022.
LUIZ GUSTAVO GALLON BIANCHI
Procurador
Matrícula 4075277
LEANDRO PALHONI MAGEVISKI
Assessor Jurídico
Nº Funcional 4125029-00
[1] Art. 117 São modalidades de proposição:
[...]
XVII – os projetos indicativos;
Art. 139 As proposições constantes nos incisos I, II, III, IV, V, IX, XI, XII, XIV e XVI do art. 117, serão protocolizadas e submetidas pela Presidência à Procuradoria, no prazo de 05 dias úteis, para análise jurídica preliminar.
Parágrafo único. Nos casos de proposições submetidas ao regime de urgência especial, a Procuradoria será instada a se manifestar de imediato.
[2] Art. 122, III da Resolução nº.: 278/2020
[3] MARTINS, Flávio. Curso de Direito Constitucional. 3ª ed. São Paulo, SP: SaraivaJur. 2019.
[4] Idem.
[5] Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.
[6] Constituição Federal Interpretada. Organizadores Costa Machado e Anna Candida da Cunha Ferraz. 9ª Ed. Barueri, SP: Malone, 2018. Página 120.
[7] Ação direta de inconstitucionalidade. 2. Lei estadual nº 5.645/1998, do Espírito Santo. Indenização de vítimas de violências praticadas por agentes estatais. 3. Inexistência de vício formal. Responsabilidade civil do Estado. Regulação de matéria exclusiva de direito administrativo. 4. Não regulação de matéria de competência exclusiva do Presidente da República. Inocorrência de usurpação de competência privativa da União. 5. Ação direta julgada improcedente.
(ADI 2255, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 19/11/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-021 DIVULG 30-01-2015 PUBLIC 02-02-2015)
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