| Recebimento: 29/05/2025 |
Fase: Distribuir proposição ao Procurador para elaboração de parecer |
Setor:Procuradoria |
| Envio: 07/10/2025 18:09:15 |
Ação: Parecer Emitido
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Tempo gasto: 131 dias, 6 horas, 26 minutos
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Complemento da Ação:
Processo nº: 3429/2025
Projeto de lei nº: 727/2025
Requerente: Executivo Municipal.
Assunto: “Dispõe Sobre o Sistema Único de Assistência Social do Município da Serra e Revoga a Lei Nº 4388, de 13 de agosto de 2015”.
Parecer nº: 641/2025
PARECER PRÉVIO DA PROCURADORIA GERAL
1. RELATÓRIO
Cuidam os presentes autos do Projeto de Lei nº 727/2024, de autoria do Excelentíssimo Senhor Prefeito do Município da Serra, que, por meio da Mensagem nº 031/2025, apresentou Projeto de Lei que trata do Sistema Único de Assistência Social do Município da Serra.
Em sua justificativa, alegou, em síntese, que o presente Projeto de Lei tem por objetivo atualizar a legislação que regulamenta o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) no Município da Serra, revogando a Lei nº 4.388, de 13 de agosto de 2015. A proposta fundamenta-se na Resolução nº 12, de 04 de dezembro de 2014, da Comissão Intergestores Tripartite (CIT), que orienta os municípios a estruturarem seus sistemas locais de assistência social de forma descentralizada e participativa, respeitando as competências constitucionais e as especificidades territoriais. Considera ainda o Plano Municipal de Assistência Social (PMAS) 2022–2025, aprovado pela Resolução nº 22/2022 do Conselho Municipal de Assistência Social (COMASSE), que estabelece como meta a atualização da referida lei, visando adequar a política municipal às normas nacionais e aprimorar a qualidade dos serviços prestados à população. Dessa forma, a atualização proposta busca fortalecer a regulação, a gestão e o controle social da política de assistência social, assegurando o acesso universal, integral e de qualidade aos serviços, benefícios e programas socioassistenciais no âmbito do município, motivo pelo qual propôs o presente projeto.
Em face do exposto, foram encaminhados os presentes autos à Presidência desta Casa de Leis, a qual conheceu a Mensagem e, ato contínuo, os remeteu a esta D. Procuradoria para análise e confecção de parecer jurídico.
Nestes termos, relatado o feito na forma dos parágrafos anteriores, passo a opinar.
2. FUNDAMENTAÇÃO
Nestes termos, relatado o feito na forma dos parágrafos anteriores, passo a opinar.
Ab initio, é preciso ressaltar que o presente parecer é meramente opinativo e decorre do mandamento consubstanciado no art. 18, IV, da Lei Municipal nº 6.134/2025, o qual determina à Procuradoria elaborar pareceres escritos nos processos que lhe forem encaminhados pelo Presidente desta Augusta Casa de Leis, a fim de assegurar a correta e justa aplicação do ordenamento jurídico pátrio, bem como resguardar as competências atribuídas pela Lei Orgânica do Município e as normas estabelecidas na Resolução nº 278/2020.
Cumpre destacar que a elevação de um Projeto ao patamar de Lei Municipal passa sempre pela comprovação dos requisitos constitucionais e legais para a sua regular tramitação.
Do ponto de vista material, e atentando para a regra constitucional que prescreve a competência legislativa local dos municípios, se percebe claramente que, não estando a matéria aqui tratada no rol daquelas de competência legislativa privativa da União ou dos Estados, não há óbice para que o assunto seja regulado por Lei Municipal.
Este entendimento decorre do art. 30, I e II, da Constituição Federal, do art. 28, I e II, da Constituição Estadual e do art. 30, I, II e V, e 99, XIV, da Lei Orgânica Municipal, todos dispositivos que asseguram a competência da Câmara Municipal para legislar acerca de assuntos de interesse local, suplementando a legislação federal e estadual.
Constituição Federal
Art. 30. Compete aos Municípios:
I - legislar sobre assuntos de interesse local;
II -suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;
Constituição Estadual
Art. 28. Compete ao Município:
I - legislar sobre assunto de interesse local;
II -suplementar a legislação federal e estadual no que couber;
Lei Orgânica do Município da Serra
Art. 30 - Compete ao Município da:
I - legislar sobre assuntos de interesse local;
II - Suplementar a legislação federal e estadual, no que couber;
Art. 99 - Compete à Câmara, com a sanção de Prefeito:
XIV - legislar sobre assuntos de interesse local;
Nessa toada. a Constituição Federal, em seu artigo 24, inciso XIV, estabelece a competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para legislar sobre "proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência". De forma mais ampla, a assistência social é matéria de competência legislativa concorrente, cabendo à União editar as normas gerais (Lei nº 8.742/1993 - Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS) e aos Estados e Municípios a competência suplementar, para atender às suas peculiaridades e interesses locais (art. 30, II, CF).
O Projeto de Lei em análise visa, justamente, a organizar o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) no âmbito municipal, em conformidade com as diretrizes federais. Portanto, o Município da Serra possui competência para legislar sobre a matéria.
Quanto à iniciativa, o artigo 143, parágrafo único, da Lei Orgânica do Município da Serra, estabelece como de iniciativa privativa do Prefeito as leis que disponham sobre:
Criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica do Executivo;
Organização administrativa e pessoal da administração do Poder Executivo;
Criação, estruturação e atribuições das Secretarias Municipais e órgãos do Poder Executivo.
O Projeto de Lei em tela trata diretamente da estruturação de uma política pública, definindo o órgão gestor (Secretaria Municipal de Assistência Social), as instâncias de deliberação (Conselho e Conferência) e os instrumentos de gestão (Fundo, Plano). Tais matérias se enquadram perfeitamente nas hipóteses de iniciativa reservada ao Chefe do Poder Executivo, pois dizem respeito à organização e atribuições de órgãos da administração.
Como o projeto foi proposto pelo próprio Prefeito Municipal, não se vislumbra a existência de vício de iniciativa formal. Pelo contrário, a propositura pelo Executivo é a forma constitucionalmente adequada para a matéria.
STF - ADI: 6180 SE, RELATOR: DIAS TOFFOLI, DATA DE JULGAMENTO: 15/08/2023, TRIBUNAL PLENO, DATA DE PUBLICAÇÃO: 24/08/2023 - EMENTA - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. LEIS ESTADUAIS. QUESTÃO PRELIMINAR. COMPLEXO NORMATIVO. ADITAMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. CONHECIMENTO. MÉRITO. CRIAÇÃO, EXTINÇÃO E TRANSFORMAÇÃO DE CARGOS, FUNÇÕES OU EMPREGOS PÚBLICOS. ARTIGO 48, INCISO X, C/C O ART. 61, § 1º, INCISO II, ALÍNEA A, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CHEFE DO PODER EXECUTIVO. PRERROGATIVA. DECRETO. ARTIGO 84, INCISO VI, ALÍNEAS A E B, DA CF. PRECEDENTES. TRANSFORMAÇÃO DE FUNÇÕES DE CONFIANÇA EM CARGOS EM COMISSÃO E VICE-VERSA. POSTOS FUNCIONAIS DE NATUREZAS DISTINTAS. PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL. NÃO OBSERVÂNCIA. TRIBUNAL DE CONTAS. RESSALVA DOS POSTOS OCUPADOS. OBRIGATORIEDADE. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. Questão preliminar: conhecimento da ação, nos termos em que foi aditada a petição inicial, a fim de que o objeto de apreciação da presente ação direta de inconstitucionalidade abarque a totalidade do complexo normativo estadual que disciplina a matéria impugnada. Precedentes. Mérito: a criação, extinção e transformação de cargos, funções ou empregos públicos depende, em regra, de lei formal e específica para cada situação, de iniciativa do chefe do Poder Executivo, nos termos do art. 48, inciso X, c/c o art. 61, § 1º, inciso II, alínea a, da Constituição Federal, regra de absorção compulsória pelos estados-membros, os quais devem seguir o modelo federal em seus parâmetros e limites. Precedentes. Há autorização constitucional para que o chefe do Executivo disponha, em certas situações, mediante decreto, sobre organização e funcionamento da Administração Pública, desde que observadas as condições previstas no art. 84, inciso VI, alíneas a e b, da Constituição. Todavia, para fins de mera reorganização interna da Administração Pública, não é cabível a transformação, mediante decreto ou outro ato normativo infralegal, de funções de confiança em cargos em comissão e vice-versa, uma vez que tais postos funcionais possuem naturezas e formas de provimento distintas, por expressa disposição constitucional (art. 37, inciso V, da CF). Eventual prerrogativa do chefe do Executivo para transformação entre si de postos funcionais de naturezas diversas equivaleria, em última análise, a uma autorização para extinguir cargos e funções públicas e, na sequência, criar outros em seu lugar, tudo isso mediante fonte normativa infralegal, isto é, sem observância ao princípio constitucional da reserva legal. Ademais, para cada um desses novos cargos ou funções seria logicamente instituída a respectiva remuneração ou gratificação pecuniária, providência condicionada ao princípio da reserva legal, consoante já decidido pela Suprema Corte. As normas dispostas no art. 43, incisos I e II, da Lei nº 8.496/18 do Estado de Sergipe, ao autorizarem o Executivo estadual a proceder, com vistas à execução da lei, à transformação de “cargos em comissão em funções de confiança” e vice-versa, por ato infralegal, mostram-se incompatíveis com a Constituição Federal. Isso porque i) atribuem ao Chefe do Executivo competência que vai além da mera organização administrativa, porquanto conferem a ele, na prática, poderes para extinguir cargos e funções públicas e criar outros em seu lugar, com fixação da correlata gratificação, sem edição de lei formal e ii) viabilizam a transformação de cargos comissionados em funções de confiança e vice-versa, providência vedada, uma vez que eles são postos funcionais de natureza distinta. Não obstante possuam autonomia funcional, administrativa e financeira, as cortes de contas devem, no contexto das medidas normativas para sua organização e funcionamento interno, guardar observância aos mesmos limites estabelecidos a esse respeito no art. 84, inciso VI, alíneas a e b, da CF, quais sejam: não gerar aumento de despesa; e extinguir funções ou cargos públicos somente nos casos de vacância. A norma inserta no art. 6º da Lei Sergipana nº 2.963/91, apesar de bem observar a vedação constitucional de aumento, ao dispor que fica autorizado o Tribunal de Contas Estadual, “em relação aos Cargos em Comissão e Funções de Confiança, a transformá-los, modificá-los, extingui-los”, não faz a necessária ressalva de que a extinção de cargos ou funções públicas apenas pode recair sobre os postos vagos. Não observância dos moldes previstos na alínea b do inciso VI do art. 84 da CF. Ação direta de inconstitucionalidade cujo pedido é julgado procedente para: i) se declarar inconstitucional o art. 43, incisos I e II, da Lei nº 8.496/18 do Estado de Sergipe; ii) tendo em vista o efeito repristinatório da declaração de inconstitucionalidade da referida norma da Lei nº 8.496/18, se declarar igualmente inconstitucionais o art. 50, incisos I e II, da Lei nº 3.591/95; o art. 62, incisos I e II, da Lei nº 4.749/03; o art. 65, incisos I e II, da Lei nº 6.130/07; o art. 73, incisos I e II, da Lei nº 7.116/11; e o art. 49, incisos I e II, da Lei nº 7.950/14 do Estado de Sergipe; e iii) se conferir interpretação conforme ao art. 6º da Lei nº 2.963/91 do Estado de Sergipe, a fim de se esclarecer que a extinção de cargos ou funções públicas, mediante ato normativo infralegal, somente pode recair sobre postos vagos.
O STF reafirma que a criação, extinção e transformação de cargos e a organização da administração pública são matérias de iniciativa reservada ao Chefe do Executivo, sendo regra de observância obrigatória pelos municípios.
Importante destacar que o Projeto de Lei estrutura o SUAS no município, prevendo:
Órgão Gestor: Secretaria Municipal de Assistência Social (SEMAS) (Art. 7º).
Instâncias de Deliberação: O Conselho Municipal de Assistência Social (COMASSE) (Art. 17) e a Conferência Municipal de Assistência Social (Art. 30).
Fundo: O projeto menciona o Fundo Municipal de Assistência Social (FMAS) como instrumento de financiamento (Arts. 56 a 58), cuja gestão e fiscalização são detalhadas.
A criação e estruturação de conselhos e fundos vinculados a uma secretaria municipal são atos típicos de organização administrativa. A jurisprudência é pacífica no sentido de que leis que criam ou alteram a estrutura de órgãos da administração, gerando novas atribuições e, consequentemente, despesas, são de iniciativa privativa do Executivo.
O Tribunal de Justiça do Espírito Santo já decidiu que a lei de iniciativa parlamentar que confere atribuições ao Conselho Municipal de Assistência Social invade a esfera de competência exclusiva do Chefe do Executivo.
No caso em análise, sendo a iniciativa do próprio Prefeito, não há inconstitucionalidade na criação ou reestruturação dessas instâncias, nem na previsão de despesas para sua manutenção, como o repasse de percentuais do IGD-SUAS para o conselho (Art. 17, § 2º) ou o pagamento de profissionais (Art. 57, X).
Assim, o projeto de lei não apresenta usurpação de poderes, uma vez que se limita a organizar a política de assistência social no âmbito do Poder Executivo, em conformidade com as diretrizes do sistema federativo do SUAS. Não há invasão de competências do Poder Legislativo ou Judiciário.
Da mesma forma, não se identifica violação a direitos e garantias fundamentais. Ao contrário, a lei busca dar efetividade ao direito social à assistência social, previsto no artigo 6º da Constituição Federal, organizando os serviços, programas e benefícios destinados à população em situação de vulnerabilidade.
Por derradeiro, a revogação da Lei Municipal nº 4.388/2015 (Art. 59) é uma técnica legislativa adequada para atualizar e consolidar a normativa municipal sobre o tema, evitando a coexistência de normas conflitantes e garantindo segurança jurídica.
Com relação às questões de técnica legislativa, observo que o projeto de lei atendeu às principais diretrizes da Lei Complementar nº 95/1998.
Nesse contexto, cumpre esclarecer que, conforme estabelece o art. 141 e seus parágrafos do Regimento Interno desta Câmara Legislativa, nos termos da Resolução nº 278/2020, as proposições devem ser protocolizadas eletronicamente ou, excepcionalmente, no Protocolo Geral da Casa, sendo numeradas em ordem sequencial e encaminhadas à Presidência, prevalecendo, em caso de matérias idênticas, a de protocolo mais antigo, com arquivamento das demais. No entanto, após consulta ao sistema legislativo e ao sítio eletrônico desta Casa, verifica-se que não há, nesta Sessão Legislativa, qualquer outra proposição com o mesmo objeto, não incidindo, portanto, o óbice de duplicidade previsto no referido artigo, tampouco a vedação do art. 67 da Constituição Federal, que trata da reapresentação de projetos rejeitados na mesma sessão legislativa.
Ante a todo o exposto, entendo que o presente Projeto de Resolução reúne os requisitos mínimos legais para a sua tramitação.
3. CONCLUSÃO
Posto isso, firmada em todas as razões e fundamentos já expostos, opina esta Procuradoria pelo regular prosseguimento do Projeto de Lei nº 727/2025, sem embargos de eventual análise jurídica sobre o mérito da presente matéria, em caso de solicitação pelas Comissões Competentes, Mesa Diretora e Presidência ou outras questões não abordadas neste parecer.
Ressaltamos que o presente Parecer é de natureza opinativa e não vinculatório específico para este processo, de modo que, todos aqueles participantes do processo, em especial o gestor público, dentro da margem de discricionariedade, juízo de valor e ação que lhes são conferidos, deverão diligenciar pela observância dos princípios e normas constitucionais e infraconstitucionais no caso em destaque.
Destarte, ressaltamos que, incumbe a esta Procuradoria Geral prestar consultoria sob o prisma estritamente jurídico, não lhe competindo adentrar nas razões e pertinência temática do projeto, motivo pelo qual o presente posicionamento não contém natureza vinculativa e sim opinativa, não vinculando o posicionamento desta Procuradoria para outras situações concretas, ainda que parecidos a este projeto.
Esses são os esclarecimentos que formam nosso parecer.
Serra/ES, 30 de setembro de 2025.
FERNANDO CARLOS DILEN DA SILVA
Procurador
Nº Funcional 4073096
MAYCON VICENTE DA SILVA
Assessor Jurídico
Nº Funcional 4113594-2
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Documento(s) da tramitação:
Despacho Digital
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